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Chão Urbano

Chão Urbano ano XII - Número 3 Maio/Junho 2012

01/05/2012

Integra:

 

ANO XII– N° 3 MAIO / JUNHO 2012

 

Editor

Mauro Kleiman

 

Publicação On-line

Bimestral

 

Comitê Editorial

Mauro Kleiman (Prof. Dr. IPPUR UFRJ)

Márcia Oliveira Kauffmann Leivas (Dra. em Planejamento Urbano e Regional)

Maria Alice Chaves Nunes Costa (Dra. em Planejamento Urbano e Regional)

Viviani de Moraes Freitas Ribeiro (Dra. Planejamento Urbano e Regional IPPUR/UFRJ)

Luciene Pimentel da Silva (Profa. Dra. – UERJ)

Hermes Magalhães Tavares (Prof. Dr. IPPUR UFRJ)

Hugo Pinto (Doutorando em Governação, Conhecimento e Inovação, Universidade de Coimbra – Portugal)

 

IPPUR / UFRJ

Apoio CNPq

 

LABORATÓRIO REDES URBANAS

LABORATÓRIO DAS REGIÕES METROPOLITANAS

 

Coordenador Mauro Kleiman

 

Equipe

Isabel Gonçalves Coelho Laurindo, Isadora Silva de Araújo, Nínive Gonçalves Miranda Daniel, Roselea Barbosa Valadão

 

Pesquisadores associados

Audrey Seon, Humberto Ferreira da Silva, Márcia Oliveira Kauffmann Leivas, Maria Alice Chaves Nunes Costa, Viviani de Moraes Freitas Ribeiro, Vinícius Fernandes da Silva, Pricila Loretti Tavares

 

 

 

ÍNDICE

 

Parcelamento Do Solo Urbano: Uma Abordagem Sistêmica

Mariel Lima de Oliveira e

Armando Carlos de Pina Filho...............p.3

 

 

 

 

PARCELAMENTO DO SOLO URBANO: UMA ABORDAGEM SISTÊMICA

 

Mariel Lima de Oliveira[1], Armando Carlos de Pina Filho[2]

 

 

1 - INTRODUÇÃO

            A cidade, primordialmente vista como um produto se constitui em um organismo composto de um conjunto de diversidades produzidas por vários agentes interventores. Cada intervenção estabelecida nesse organismo afeta profundamente a sua complexidade orgânica visto que, como tal, as relações funcionais da cidade em todos os seus aspectos, o social, o da mobilidade urbana, o da sustentabilidade ambiental, o da infra-estrutura urbana, o dos serviços urbanos, enfim toda essa rede de sistemas isolados é interagente neste complexo chamado urbe e não há forma de intervir em um deles sem refletir efeito em outros. A partir dessa visão da cidade se entende que uma abordagem cartesiana de sua problemática, embora de forma pontual possa ser eficaz, não conduz a soluções eficientes para o organismo urbano enquanto desconsidera os reflexos do problema tratado no corpo da cidade. Pretender, portanto, estudar e, eventualmente, solucionar as questões do uso e ocupação do solo urbano exige uma abordagem sistêmica da urbe.

Abordagem sistêmica se baseia na idéia de que um objeto de estudo possui muitas dimensões e facetas que podem ser estudadas por várias ciências e que conceitos e princípios vindos de diferentes ciências podem ser empregados no estudo e compreensão de um fenômeno por determinada ciência. Assim, ao se abordar a questão do uso e ocupação do solo urbano de forma sistêmica, há que se compor uma equipe multidisciplinar que permita a análise das diversas faces da questão e se forme um conjunto de saberes científicos associados que promovam a eficácia pontual com eficiência global.

Brian McLoughlin, em seu clássico livro “Urban & regional planning: a systems approach” (MCLOUGHLIN, 1969), lança as bases da abordagem sistêmica no estudo das cidades. Segundo ele, a cidade é um sistema composto por partes (as atividades humanas e os espaços que as suportam) intimamente conectadas (fluxos e canais de circulação). Por isso, para intervir nesse sistema não é mais suficiente o enfoque exclusivamente espacial dos arquitetos (segundo sua visão)  , dominante até então. Ao contrário, é necessário reconhecer o caráter dinâmico e sistêmico das cidades.



[1] Universidade Federal do Rio de Janeiro, Escola Politécnica, Programa de Engenharia Urbana. Mestrando. Formação: Arquiteto, Docência no Ensino Superior, Ensino de Arquitetura e Urbanismo.

 

[2] Universidade Federal do Rio de Janeiro, Escola Politécnica, Programa de Engenharia Urbana. Professor. Formação: D.Sc. em Engenharia Mecânica (COPPE/UFRJ), M.Sc. em Engenharia Mecânica (COPPE/UFRJ), Engenheiro e Técnico Industrial Mecânico.

A cidade vista como um sistema composto por subsistemas e, por sua vez,

parte de um sistema mais amplo. Fonte: McLoughlin (1969, p. 76)

 

Partindo desse argumento, McLoughlin propõe uma seqüência de etapas que devem ser seguidas durante o processo analítico de planejamento e que, ao contrário da tradição arquitetônica, não acaba com a seleção das ações a serem implementadas (ou, no caso dos arquitetos, com o projeto físico da área). A abordagem da questão, portanto, passa a ser vista como um processo cíclico, que envolve a aplicação de diversas ciências afetas aos subsistemas, no qual os resultados alcançados pelas ações passam a servir de objeto de análise que gera retro alimentações para as outras fases do processo.

            Neste artigo se busca focar o parcelamento do solo urbano como vetor da ocupação futura por uma abordagem sistêmica, estabelecendo uma crítica do enfoque formal versus o enfoque real na produção dos loteamentos, entendido como formal o enfoque legal da produção e como enfoque real os objetivos intrínsecos dos agentes, públicos ou privados, produtores dos loteamentos.

 

 

2 - A ESTRUTURAÇÃO URBANA E O PARCELAMENTO DO SOLO

            O parcelamento do solo se configura como o principal instrumento de estruturação da cidade e o espaço criado por sua implantação, o loteamento, mantém sua estrutura por muito tempo. Dessa forma, esse espaço urbano criado hoje será utilizado plena e principalmente por gerações futuras.

            O fato de se estar projetando o espaço do futuro, ao planejar o parcelamento de glebas, a maioria das vezes ainda rurais, que se incorporam ao espaço urbano em forma de loteamento, impõe a responsabilidade de se garantir um espaço de qualidade. Tal qualidade, entretanto, reside não apenas no cumprimento das leis de parcelamento constantes dos Planos Diretores Urbanos, mas principalmente em se adotar uma postura de produção que enfoque a busca da qualidade de vida, do conforto e da sustentabilidade ambiental.  O urbanista que projeta esse espaço não deve se limitar ao tratamento estritamente técnico do parcelamento, a nível de topografia, divisão do solo em lotes, sistema viário e infra-estrutura, ao padrão mínimo exigido por lei, mas também se revestir da preocupação com a incorporação desse novo espaço na malha urbana existente considerando o seu impacto na estrutura social local. Deve ainda considerar as demandas produzidas pela futura ocupação, tanto as sociais quanto as físicas, como esgotos sanitários, drenagem pluvial, consumo de água, alimentos, vetorização de tráfego e transporte, e na capacidade de absorção dessas demandas pela infra-estrutura existente na vizinhança. Enfim, adotar uma abordagem sistêmica do projeto não se restringindo ao micro espaço do parcelamento, porém ao macro espaço urbano da região onde se implanta o projeto.

            Trabalhar nesse paradigma sistêmico pode levar o urbanista ao confronto conceitual com os seus pares na tarefa produtiva do parcelamento, a nível dos objetivos formal e real que possuam em relação ao projeto. Aqui se situa um momento delicado do processo, pois caberá ao urbanista como agente técnico dessa intervenção harmonizar os enfoques de seus pares com a abordagem sistêmica que impõe ao seu trabalho, sobretudo pela visão conseqüente, demonstrando a característica perene da urbanização.

            Quando se projeta um loteamento é preciso compreender que aquele projeto irá perdurar por muitas décadas, até séculos. Nesse tempo, normalmente, as ruas se mantém como um espaço que pouco se altera. Os lotes podem tomar diferentes formas, se desdobrando ou agrupando, o uso do solo pode se modificar, a massa das edificações se altera, mas a configuração urbanística caracterizada pela estrutura viária projetada dificilmente se modifica. É nessa estrutura viária que se processa a integração do novo espaço urbano criado com a cidade que o recebe, e esta integração necessita ser definida com uma visão holística, no mínimo, da região em que se insere para que a carga impactante do projeto favoreça o desenvolvimento harmônico da urbe e não apenas um crescimento isolado, estranho à dinâmica sócio-espacial da cidade.

3 - OS AGENTES INTERVENTORES DO PARCELAMENTO, SEUS ENFOQUES E VISÕES

            Ao se intervir na malha urbana existente na cidade incorporando um loteamento, essa intervenção é promovida basicamente por dois agentes interventores, o Poder Público e a Iniciativa Privada. Cada um desses agentes tem enfoques particulares em relação à questão do parcelamento do solo urbano e que, em ambos os casos, margeiam o enfoque formal, os aspectos legais inerentes à produção do parcelamento. Além desses dois agentes básicos, há outros agentes interventores no processo produtivo do parcelamento, que exercem as funções executivas e executoras aos níveis de projeto e construção e outros que exercem a função fiscalizadora da sociedade a nível da formalidade legal do projeto e da defesa quanto ao impacto ambiental e de vizinhança que o projeto possa causar, e que também tem os seus enfoques particulares em relação ao loteamento.  Há ainda as visões desses agentes que permeiam a atividade de urbanização e que também, como os enfoques particulares, possuem contradições de interesses e que, conforme a condição funcional de cada um pode ter ênfase na técnica, na economia, na administração, na política. Essas visões que se denominam de Visão Técnica, Visão Econômica, Visão Administrativa e Visão Política, exercem influência transversal nos procedimentos específicos de cada agente interventor.

Como se vê, existe uma estrutura produtiva que demanda os parcelamentos urbanos que se compõe de um conjunto de agentes interventores com enfoques diversos e visões específicas, que permeiam a urbanização e, no fundo, terminam por dificultar a abordagem sistêmica do processo.  No quadro a seguir se apresentam esses agentes, identificando os enfoques particulares de cada um, de ordem formal ou real e a possível visão que os permeiam:


Fonte: Quadro organizado pelos autores

            No andamento do processo de aprovação do parcelamento projetado, o urbanista se defronta com a ação de cada um os agentes interventores na produção do parcelamento do solo urbano os quais, via de regra, atua isoladamente segundo seus próprios enfoques e visões, perseguindo seus objetivos formais e/ou reais. Mesmo os órgãos públicos componentes de uma mesma estrutura administrativa, como as secretarias municipais, por exemplo, divergem em seus enfoques e objetivos enquanto convivem com uma desordem administrativa que, muitas vezes, sobrepõe atuações em um mesmo processo.

            Os objetivos formais do loteador, que seriam criar um espaço adequado para a habitação humana, atendendo as necessidades do mercado alvo e às demandas do mercado imobiliário, geralmente conflitam com seus objetivos reais, que seriam garantir a maior rentabilidade do investimento empregado com a máxima taxa de aproveitamento do terreno e um retorno do capital no menor tempo possível, com rápido início das vendas. Esses objetivos reais do empreendedor podem também conflitar com os objetivos da sociedade, representada pelo poder público e que também detém seus objetivos formais e reais. A harmonia desses interesses deveria então ser promovida pela aplicação da legislação e normas para o parcelamento, mas freqüentemente as normas e a aplicação da legislação também são conflitantes.

4 - OS PLANOS DIRETORES MUNICIPAIS E SUAS LEIS DE PARCELAMENTO

            A consulta a planos diretores municipais recentemente produzidos no país, nos municípios com mais de 20.000 habitantes leva a constatar que o tratamento do uso e ocupação do solo e do parcelamento do solo, nesses planos diretores tratados em leis distintas, geralmente não foi analisado por um paradigma sistêmico, não refletindo coerência as proposições de zoneamento urbano para uso e ocupação do solo e os modelos de parcelamento propostos.

            As leis de parcelamento do solo imputam aos incorporadores a responsabilidade da produção da infra-estrutura urbana em seus loteamentos, que deverão ser produzidos em conformidade com modelos de parcelamento definidos e determinados a produzir em certas zonas em que se divide o solo urbano. O mínimo de infra-estrutura que se obriga ao incorporador incluiu o abastecimento d’água potável, a rede de coleta de esgotos sanitários, a drenagem pluvial do sistema viário, o próprio sistema viário em um dimensionamento hierárquico estabelecido e padrão de pavimentação definido. Naturalmente que é justo que o espaço urbano criado com objetivos comerciais pelo loteador, seja por este suprido dessas facilidades urbanas de modo a não onerar o tesouro público em suas produções. Entretanto, a ausência de uma abordagem sistêmica no estudo da urbe para a feitura da lei, termina por criar situações de agravamento das condições muitas vezes precárias, quando existem, dessas redes de facilidades urbanas na circunvizinhança do parcelamento que se implanta. Um exemplo típico dessa situação é a questão da drenagem pluvial, que impõe ao loteador o projeto e construção da micro-drenagem do espaço loteado, enquanto não há de parte do poder público um plano diretor de macro-drenagem urbana que dirija o escoamento produzido no espaço loteado aos fluxos hídricos e reservatórios naturais que absorvam essas águas. Assim, a produção eficaz da micro-drenagem pelo loteador não dispõe de eficiência em relação ao macro espaço em que se insere, transferindo suas águas às zonas baixas da vizinhança e dando causa a cheias que não decorriam antes do empreendimento, e todas as demandas decorrentes que vão onerar a capacidade de serviços públicos no local.

            Os instrumentos de controle da expansão urbana, do uso e ocupação do solo, pretensamente dispostos nas leis de zoneamento inclusas nos planos diretores, não encontram ajuste harmônico com os modelos de parcelamento propostos, geralmente resultando em adensamentos além ou aquém daqueles pretendidos no zoneamento o que pode levar, por exemplo, a um subdimensionamento do sistema viário no futuro.

5 - ABORDAGEM SISTÊMICA DA PRODUÇÃO DE URBANIZAÇÃO

            Para uma abordagem sistêmica da produção de urbanização através do parcelamento do solo é preciso que se entenda, primordialmente, a urbanização como elemento integrante/integrador da cidade. A produção de novos espaços urbanos sempre causará impactos ao ambiente em que se insere. Esses impactos devem ser minimizados, mas para tal necessitam ser conhecidos e o estudo isolado do parcelamento não permitirá tal conhecimento, pois este se resolverá em si mesmo. Em uma abordagem sistêmica o solo urbano criado pelo loteamento se integra e absorve a cidade como integrante de si mesmo, passando a gerar efeitos diretos e indiretos em sua relação com a cidade vivenciando as relações de produção e consumo do ambiente urbano. Assim, o loteamento passa a criar novas demandas de transporte, infra-estrutura e serviços públicos, enquanto agrega à cidade equipamentos públicos e comunitários construídos em sua produção.

Fonte: original dos autores

 

O local produzido se insere diretamente na região urbana adjacente e por esta, indiretamente no meio ambiente urbano total, sendo elemento integrante/integrador da cidade.

            A integração do loteamento como novo espaço urbano criado na complexidade sócio espacial da cidade, o coloca como agente das relações de produção e consumo gerando demandas e suprimentos.

Fonte: original dos autores

           

A integração da nova urbanização no meio urbano existente deve ser revestida dos cuidados necessários a que possa contribuir com melhoramentos do meio e não no agravamento das deficiências existentes. Portanto, o urbanista deve trabalhar o projeto por uma abordagem sistêmica da região urbana em que se insere, identificando as possibilidades locais, suas disponibilidades e suas necessidades na complexidade da estruturação urbana, considerando os pontos de integração, como na figura a seguir.

Fonte: original dos autores

            O processo de integração da nova urbanização no complexo sócio-espacial da cidade gera efeitos tanto positivos quanto negativos para a estruturação urbana e que podem conduzir um crescimento/desenvolvimento tanto adequado quanto nocivo em relação ao status local, visto que tais efeitos podem ser pontualmente positivos em determinada região da cidade e negativos em outra. Esses efeitos, portanto, devem ser analisados em uma abordagem sistêmica da região urbana onde se insere o loteamento, de forma a identificar a qualidade do impacto no processo de integração do novo parcelamento. Via de regra os principais, e mais notáveis, efeitos que se manifestam nesse processo de adição de uma nova urbanização a uma região urbana consolidada são:

  • ALTERAÇÃO DA PAISAGEM
  • ALTERAÇÃO DO USO DO SOLO
    • Alteração do eco-sistema urbano (micro clima – ilhas de calor; vegetação; poluição em geral – domus de poeira)
  • CRIAÇÃO DE NOVAS DEMANDAS DE SERVIÇO PÚBLICO
  • CRIAÇÃO DE NOVAS DEMANDAS DE COMÉRCIO E SERVIÇO
  • IMPLICAÇÕES COM O ENTORNO
    • Valorização/Desvalorização de imóveis
    • Alteração do uso do solo
    • Saturação da infra-estrutura
    • Saturação de serviços públicos
    • Saturação de transporte
    • etc.

O urbanista ao proceder essa identificação dos impactos, de forma sistêmica, deve ter em mente alguns dos desejos comuns que se identificam na concepção ideal de cidade que a sociedade manifesta, tais como:

  • FACILIDADE E RAPIDEZ DE TRANSPORTE
  • BOAS CONDIÇÕES DE HABITABILIDADE PARA TODOS
  • FACILIDADES URBANAS:
    • Segurança
    • Educação
    • Cultura
    • Saúde
    • Entretenimento
    • Lazer
  • AR PURO
  • BAIXO NÍVEL DE RUÍDO
  • CÓRREGOS LIMPOS
  • RUAS LIMPAS
  • ALTO NÍVEL DE ARBORIZAÇÃO
  • CONECÇÃO EM TEMPO REAL COM O MUNDO.

Ao conceber o novo espaço urbano caberá ao urbanista, diante essas identificações de efeitos e desejos, encontrar a melhor solução possível a promover uma integração harmônica entre a cidade e o novo espaço urbano projetado. Para tal, dentro dos princípios de uma abordagem sistêmica, há uma série de itens importantes a se considerar numa intervenção urbana procedendo a uma análise comparativo-adaptativa entre o existente e o projetado que, de forma sugestiva, se lista a seguir:

v  Infra-estrutura

v  Sistema viário

v  Meio físico-ambiental

v  Aspectos sócio-culturais

v  Aspectos econômicos

v  Legislação e zoneamento

v  Áreas públicas: verdes/ lazer/ institucional

v  Índices demográficos

v  Uso e ocupação do solo

v   Aspectos administrativos

v  Tipologias arquitetônicas

v  Transportes coletivos, individuais e de carga

v  Fluxos: pedestres, transportes, mercadorias, lixo, etc.

v  Super-estrutura: educação, creches, segurança, cultura, etc.

v  Paisagem e estética

v  Inter-relações locais e regionais

            Outra importante etapa no processo de produção dos novos espaços urbanos compete ao poder público como o agente interventor que representa a sociedade na decisão de aprovar, ou não, a nova urbanização concebida. Também o poder público, talvez principalmente, deveria abordar de forma sistêmica o sócio-espaço urbano buscando em seus enfoques o desenvolvimento harmônico da urbe. Acometido, entretanto, das mazelas de fundo político e, lamentavelmente, de uma desintegração administrativa de suas repartições, aliados a indisponibilidade de corpo técnico em seus quadros, a maioria dos municípios brasileiros vive uma situação de governança sazonal, resolvendo hoje o problema de ontem, com total impresivibilidade do amanhã. Há, ainda, uma distribuição de competências que, se tem arrazoamento político, torna capenga a eficiência dos poderes públicos na gestão das cidades. Muitos estados, por exemplo, detém a competência do tratamento e da distribuição de água potável e a coleta de esgotos sanitários, por concessão dos próprios municípios. O que se tem visto é que não ocorre um ajustamento entre os investimentos dessas concessionárias com o planejamento territorial dos municípios ou com as premissas de política sanitária dos planos diretores municipais. Temos também as nossas regiões metropolitanas convivendo com interesses conflitantes de fundamento político ou mesmo administrativo entre os vários municípios de áreas urbanas conurbadas que as compõe. Não há governo metropolitano, ou mesmo conselhos metropolitanos que possam influir, a partir de uma abordagem sistêmica do complexo sócio-espacial metropolitano, nas decisões municipais quanto aos subsistemas interagentes na região, como transporte de massas e disposição de resíduos sólidos, por exemplo.

            Mesmo com esse quadro não muito animador, ficaria a contento que se tivessem os agentes públicos interventores nos processos de urbanização das cidades cumprindo o papel que deles se espera segundo esses princípios:

  • ESTABELECER REGRAS CLARAS PARA A ESTRUTURAÇÃO ESPACIAL
  • ZELAR PELO INTERESSE PÚBLICO
  • FACILITAR AS AÇÕES EMPREENDEDORAS (desburocratizar) COM TRANSPARÊNCIA
  • GARANTIR O PADRÃO MÍNIMO DE QUALIDADE DO PROJETO E DA URBANIZAÇÃO
  • PROTEGER O CIDADÃO DE AÇÕES QUE POSSAM SER LESIVAS.
  • GARANTIR O FORNECIMENTO ADEQUADO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS ASSENCIAIS
  • GARANTIR O DIREITO DE TODAS AS PARTES
  • AGIR COM CORREÇÃO ÉTICA, DESPROVIDO DE INTERESSES PARTICULARES

6 - CONSIDERAÇÕES FINAIS

            O parcelamento do solo produzindo novos espaços urbanos, sem dúvida faz a cidade crescer. Não necessariamente faz a cidade se desenvolver. SOUZA, Marcelo Lopes, em seu livro “Mudar a cidade – Uma Introdução Crítica ao Planejamento e à Gestão Urbanas” sustenta:

Para sistematizar, pode-se assumir que o desenvolvimento urbano, o qual é o objetivo fundamental do planejamento e da gestão urbanos, deixa-se definir com a ajuda de dois objetivos derivados: a melhoria da qualidade de vida e o aumento da justiça social.  (SOUZA,2002:76)

            Objetivar a melhoria da qualidade de vida e o aumento da justiça social são também princípios fundamentais que conduzem o pensamento do urbanista no processo de produção do novo espaço urbano. Assim, além da restrita visão técnica das possibilidades topográficas e dimensionais do loteamento que projeta, o urbanista terá em mente que a intervenção no tecido urbano que este loteamento dará causa deverá ir além da sua mera expansão, mas fundamentalmente deverá promover desenvolvimento urbano sob uma abordagem sistêmica, que considere o espaço urbano da região em análise sob todos os cabedais científicos afetos à produção.

            Entre os anos de 1950 e 2005 a população urbana no mundo evoluiu de 29% para 49% da população total do planeta. Relativamente, a população mundial cresceu no mesmo período 2.535 milhões para 6.464 milhões, uma evolução de 154%, e a população urbana mundial cresceu de 735 milhões para 3.148 milhões, uma evolução de 329%, o que revela uma evolução da população urbana do planeta duas vezes maior que a da população total. No Brasil, entre os anos de 1940 e 2000 a população urbana evoluiu de 31,2% para 81,2 % da população total, uma evolução de 160%, enquanto a população urbana mundial cresceu em 100% no mesmo período. Em média, a população urbana brasileira está crescendo uma vez e meia mais rápido que no restante do planeta. (Fontes: ONU/IBGE).

            O que depreende dos dados é que as cidades brasileiras, mais especificamente nossas regiões metropolitanas, estão em acelerado processo de crescimento, mas não necessariamente que venha ocorrendo proporcional desenvolvimento urbano nessas regiões. À margem dos loteamentos irregulares, e até mesmo clandestinos, que ocorrem diante tão acelerado crescimento, os urbanistas atuando nos projetos de parcelamento do solo devem estar preocupados em promover um desenvolvimento sócio-espacial na cidade e da cidade, conscientes de que o desenvolvimento urbano não se confunde com a expansão do tecido urbano e sua crescente complexidade, acompanhando a modernização tecnológica e o crescimento econômico.

            Como foi dito no principio, o novo espaço urbano produzido pelo parcelamento da terra é construído hoje para ser consumido e desfrutado no futuro, deve, portanto, respeitar a população que ali deverá se desenvolver e se utilizar do espaço. A partir de uma abordagem sistêmica da região em que esse novo espaço urbano será inserido, o urbanista deverá conduzir seus projetos na busca primordial da sustentabilidade, da qualidade de vida, da qualidade paisagística e ambiental, do dimensionamento adequado dos lotes e sistema viário, da implantação dos necessários equipamentos públicos e comunitários e das áreas livres de uso público: verdes e de recreação, mesmo que os dispositivos legais que regulamentem a ocupação urbana no local não o obriguem.

 

7 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

MC LOUGHLIN, J. Brian. Urban & regional planning: a systems approach. London: Faber and Faber, 1969.

SOUZA, Marcelo Lopes. Mudar a Cidade – Uma Introdução Crítica ao Planejamento e à Gestão Urbanos. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002.

CORRÊA, Roberto Lobato. O espaço urbano. São Paulo: Ática,1993.

DEL RIO, Vicente. Introdução ao Desenho Urbano no Processo de Planejamento. São Paulo: PINI, 1990.



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