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Chão Urbano

Chão Urbano ANO XI – N° 5 SETEMBRO / OUTUBRO

01/09/2011

Integra:

 ANO XI– N° 5 SETEMBRO / OUTUBRO 2011

 

Editor

Mauro Kleiman

 

Publicação On-line

Bimestral

 

Comitê Editorial

Mauro Kleiman (Prof. Dr. IPPUR UFRJ)

Márcia Oliveira Kauffmann Leivas (Doutoranda em Planejamento Urbano e Regional)

Maria Alice Chaves Nunes Costa (Dra. em Planejamento Urbano e Regional)

Viviani de Moraes Freitas Ribeiro (Dra. Planejamento Urbano e Regional IPPUR/UFRJ)

Luciene Pimentel da Silva (Profa. Dra. – UERJ)

Hermes Magalhães Tavares (Prof. Dr. IPPUR UFRJ)

Hugo Pinto (Doutourando em Governação, Conhecimento e Inovação, Universidade de Coimbra – Portugal)

 

IPPUR / UFRJ

Apoio CNPq

 

LABORATÓRIO REDES URBANAS

LABORATÓRIO DAS REGIÕES METROPOLITANAS

 

Coordenador Mauro Kleiman

 

Equipe

Carolina Thibau Teixeira Araujo, Juliana Rocha Amaral,

Nínive Gonçalves Miranda Daniel, Isabel Gonçalves Coelho Laurindo

 

Pesquisadores associados

Audrey Seon, Humberto Ferreira da Silva, Márcia Oliveira Kauffmann Leivas, Maria Alice Chaves Nunes Costa, Viviani de Moraes Freitas Ribeiro, Vinícius Fernandes da Silva, Pricila Loretti Tavares

 

 

 

Índice


Crescer mais pequeno em Portugal – Implicações para as finanças locais dos municípios com cidades

Ana Paula Barreira e Thomas Panagopoulos.................................p.3

 

 Segregação Residencial: efeito da expansão geográfica do capital no espaço urbano brasileiro

Valéria Grace Costa................................. p.33

 

 

 

Crescer mais pequeno em Portugal – Implicações para as finanças locais dos municípios com cidades

 

Ana Paula Barreira e Thomas Panagopoulos

 

 

Resumo:

Diversas regiões na Europa e nos Estados Unidos confrontam-se com perda de população e de atividade econômica. Enquanto há zonas que têm mantido, nos últimos anos, dinâmicas de atração de residentes, há outras, em oposição, que têm vindo, de forma persistente, a perder população. As causas e consequências dos fenômenos associados ao decréscimo da população têm vindo a ser objeto de estudos recentes.

Em contrapartida, estudos que avaliem o impacto do declínio da população nas finanças locais são escassos. Os efeitos do decréscimo da população nos orçamentos locais em países como Portugal, cuja receita depende em grande medida do número de residentes, assumem uma importância nuclear. O objeto deste artigo é perceber como tem sido afetada a “saúde” orçamental dos municípios portugueses com cidades que observam declínio da população.

Os dados permitem perceber que a maioria dos municípios com declínio persistente no número de residentes, não registra uma redução nas suas receitas. Mesmo os municípios que perderam receita durante a última década, a despesa não decresceu na mesma proporção. Há ainda evidência de que os municípios procuram evitar ou adiar o downsizing que resulta da perda de receitas, estimulando, na maioria dos casos, a despesa pública, na tentativa de captar população jovem.

Palavras-chave: Finanças Locais, Declínio da população, Municípios portugueses, Cidades.

 

1.      Introdução

O enfoque tradicional da literatura sobre a economia e o planejamento urbanos tem sido no crescimento e nas suas consequências, compreendendo quer as implicações da pressão demográfica sobre os recursos, quer os efeitos da ocupação do solo, decorrente da dispersão da população. Embora os temas relacionados com o crescimento do número de habitantes sejam alargados e mereçam a atenção de muitos investigadores, o estudo do fenômeno inverso relativo à redução de residentes e suas implicações tem sido relativamente escasso. E, de facto, o abandono dos espaços levanta um novo conjunto de problemas que vão desde o envelhecimento da população, dado que os jovens dispõem geralmente de maior mobilidade, até à suburbanização – deslocamento de residentes das zonas centrais das cidades para as suas periferias.

O estudo dos efeitos da redução da população tem alguma tradição nos Estados Unidos devido à existência de diversos municípios e cidades em declínio, pelo abandono dos residentes e das atividades econômicas (exemplo: Detroit ou Chicago com perdas, respectivamente, entre 1950 e 2000, de 49 e 20% dos seus habitantes). No entanto, a investigação sobre as causas e consequências da perda de população na Europa está ainda numa fase de desenvolvimento, sendo parte significativa desta estimulada pela existência de um projeto europeu com a designação “Cidades a crescer mais pequenas”.

Segundo Hollbach-Grömig e Trapp (2006), no âmbito de um trabalho produzido para o Conselho dos Municípios e Regiões da Europa – CMRE[1], a população ativa européia decrescerá 20,8 milhões, entre 2005 e 2030, o que significa que, num prazo curto, os governos confrontar-se-ão inevitavelmente com o fenômeno de haver partes da Europa a perder residentes. Para esta situação muito contribui a decrescente taxa de natalidade, apesar do aumento da esperança média de vida.

A redução no número de residentes numa jurisdição, quer seja numa região, município ou cidade, levanta um conjunto de diversos desafios aos governos locais que têm de lidar com a existência de serviços públicos sobredimensionados, tais como a rede de distribuição de água, jardins de infância e escolas. A diminuição da procura não é acompanhada por uma contração da oferta, gerando-se um excesso que só pode ser corrigido se for possível proceder a um downsizing dos serviços públicos prestados e das infraestruturas edificadas. No entanto, a expectativa de crescimento futuro torna os governos locais resistentes à redução da oferta. Paralelamente, há dificuldades em reduzir ou em reestruturar os serviços públicos oferecidos porque nem todos podem ser desativados por partes nem pode a sua provisão ser descontinuada. Dada a dificuldade em reduzir custos, a despesa por habitante irá tendencialmente aumentar, implicando déficits orçamentais elevados para os governos locais. Dada a redução nas receitas em resultado do decréscimo no número de habitantes, só através de mecanismos de compensação, nomeadamente de transferências intergovernamentais, será possível minimizar estes efeitos. Contudo, uma eventual melhoria na situação financeira dos governos locais irá colocar problemas aos governos centrais a braços com crescentes pedidos de redistribuição, dificilmente concretizáveis num ambiente de contenção orçamental decorrente das crises internacional e das dívidas soberanas.

A perda de habitantes traz cumulativamente o problema da alteração da composição etária daqueles que permanecem nas jurisdições, aumentando a proporção de idosos. Esta alteração coloca igualmente um desafio aos governos locais dado que deveriam reconfigurar a provisão dos serviços públicos, ajustando-os às necessidades daquela população. A mudança no perfil de procura dos serviços e infraestruturas oferecidos implica um reajustamento nos investimentos efetuados na jurisdição, o qual requer acréscimo de recursos financeiros; no entanto, a tendência é, em contrapartida, para a sua diminuição, dada a redução no número de potenciais contribuintes.

O presente artigo apresenta a evolução do número de habitantes nos municípios com cidades em Portugal Continental e mostra as suas implicações para as finanças dos governos locais. A análise dos números recolhidos permite afirmar que, mesmo os municípios que registraram declínio acentuado no número de residentes nos últimos 10 anos, a maioria não registrou decréscimos nas suas receitas totais porque a redução nas receitas associadas à transação do patrimônio foram compensadas com transferências intergovernamentais. A quase ausência de ajustamento nas receitas totais deu origem a um ajustamento ainda menor nas despesas locais, havendo um número bastante diminuto de municípios com perda significativa de habitantes a proceder a uma contração na despesa.

Simultaneamente, recorrendo a uma estimação com dados em painel, foi possível verificar que a alteração da estrutura etária dos residentes, em municípios com perda persistente de população, não gera por parte dos municípios opções de despesa pública em prole dos idosos. Como antecipado pela literatura, os governos locais resistem a aceitar como inevitável o encolhimento no número de habitantes, adotando estratégias de manutenção das infraestruturas orientadas para os escalões etários mais jovens, levando ao seu sobredimensionamento. Em contrapartida, é sacrificado o ajustamento desejável dos serviços públicos prestados às necessidades da população mais envelhecida.

2.      Revisão de literatura

Alterações no número de residentes nas jurisdições, quer elas sejam países, regiões, municípios ou cidades, fazem parte das dinâmicas gerais que ciclicamente os territórios enfrentam. Nestas dinâmicas os movimentos migratórios assumem uma particular importância, significando que certas zonas atraem população enquanto outras registram uma redução de habitantes. Embora o declínio faça parte da evolução histórica dos lugares, nomeadamente das cidades (Van den Berg et al., 1982), a literatura sobre o planejamento urbano está orientada para resolver os problemas resultantes do crescimento, de onde sobressai o problema da dispersão geográfica. O advento da globalização veio acentuar estas dinâmicas uma vez que a competição internacional esbateu as fronteiras nacionais, implicando que jurisdições com menores vantagens comparativas observassem um declínio persistente da atividade econômica e, consequentemente, da sua população. De acordo com Kiely (1998), as jurisdições periféricas são particularmente vulneráveis, dado não estarem nem junto dos centros de decisão nem estarem conectadas com as principais redes internacionais.

A perda de população em grandes cidades mundiais é documentada por Oswalt e Rieniets (2007) que identificaram, nos últimos cinquenta anos, cerca de 370 cidades com um decréscimo de pelo menos 10% no número de residentes. Este fenômeno gera a existência de casas vazias e abandonadas mas traz igualmente oportunidades ligadas ao incremento de espaços verdes e à recuperação de sistemas naturais. Estas cidades enfrentam desafios como tornarem-se mais produtivas e ecologicamente sustentáveis, embora dispondo de menos habitantes (Pallagst et al., 2009).

A perda de residentes é, de facto, uma realidade para várias jurisdições da Europa e dos Estados Unidos. Na Europa, particularmente na Alemanha, tem crescido a preocupação com a saída da população de certas áreas, especialmente da ex-Alemanha de Leste, como por exemplo da província de Leipzig. Este fenômeno é também encontrado noutras zonas do mundo, como por exemplo no Brasil, onde segundo Moraes (2007), o advento da globalização durante os anos 80 e 90 implicou uma mudança no perfil territorial do País, com a consequente deslocação da população economicamente mais frágil para as orlas das cidades, gerando situações de ocupação ilegal.

Embora seja, portanto, uma realidade recorrentemente encontrada, a perda de residentes é um assunto tabu para os governos locais, preparados para lidar com os resultados de um crescimento progressivo, mas incapazes de gerir as consequências do declínio populacional. Este comportamento é racional porque, como Beauregard (2003) enfatiza, a eventual crítica dos eleitores pela aceitação da perda de residentes, que gera uma espiral de perda de receitas e, consequentemente, de mais residentes, por via da provisão de um menor número de bens públicos. Este facto força os governos locais a procurar, por todas as vias, o crescimento para evitar o suicídio político, que, muito provavelmente ocorreria, se o declínio fosse tornado público.

Segundo Tiebout (1956) as famílias decidem onde residir tendo em conta o pacote de serviços públicos colocados à sua disposição versus a carga fiscal que têm que suportar para a sua manutenção. A mobilidade é vista, neste contexto, como a consequência de uma tributação elevada em comparação com os serviços públicos e infraestruturas fornecidos, que não estarão, deste modo, ajustados às preferências dos cidadãos. Neste contexto, o “voto com os pés”, que significa a opção de uma família mudar-se para outra jurisdição é, de certa forma, visto como o resultado do fracasso de um governo local que, ou não aprovisionou a tipologia de bens públicos pretendidos pelos contribuintes, ou a sua provisão não era eficiente, traduzindo-se num custo por habitante demasiado elevado, quando comparado com outra jurisdição rival.

Neste contexto, a tendência é para retardar o reconhecimento do processo de encolhimento da população ou adotar estratégias que invertê-lo, procurando de novo trazer a jurisdição para o crescimento. Nesse intuito, segundo Basolo (1999), as jurisdições são tentadas a prosseguir estratégias fiscalmente vantajosas tais como a construção de centros comerciais, para captar atividade econômica, encetando comportamentos de competição com as jurisdições vizinhas. Panagopoulos e Barreira (2011) elencam, para o caso português, algumas das políticas implementadas pelos governos locais para tentar conter o abandono de residentes, que vão desde a atribuição de benefícios sociais a famílias que queiram casar e ficar a residir num determinado município até à prática de taxas de imposto sobre a atividade econômica mais favoráveis do que em municípios contíguos. No entanto, a maioria destas políticas não obteve resultados significativos na contenção do fenômeno de saída de residentes.

A existência de resultados insatisfatórios resulta do facto de, como apontam Rybczynski e Linneman (1999) e Muller e Siedentop (2004), planear para o crescimento ser significativamente diferente de planear para o declínio. Enquanto no primeiro caso a atuação pública visa a ocupação de novo solo para a construção de novos equipamentos e infraestruturas, no segundo os políticos devem decidir sobre como reciclar o território e como adaptar os serviços públicos às mudanças de necessidades da população que permanece na jurisdição.

O impacto nas finanças locais resultantes da redução do número de residentes e consequentemente do número de contribuintes não dispõe, como refere Bartl (2009), de nenhuma teoria que clarifique quais as implicações perspetivadas. De acordo com o autor haverá duas teorias que sugerem como os governos locais se comportarão quando confrontados com o declínio da população: a teoria da ecologia populacional e a teoria da segmentação do mercado do trabalho. De acordo com a primeira, perante o declínio no número de residentes ocorre um fenómeno de inércia que se traduz, por exemplo, na manutenção da capacidade de escolas, mesmo quando a população em idade escolar está claramente a decrescer. A razão para tal residirá no facto de os governos e as famílias, tendo em vista preservarem os seus locais de trabalho, ao mesmo tempo que pretendem evitar às crianças deslocações de transporte público, bloquearão a redução da dimensão daquelas infraestruturas. No segundo caso, registando-se um decréscimo da procura de serviços públicos pela redução do número de habitantes, o expectável é que os custos associados à componente administrativa dos governos locais decrescessem. No entanto, a contração no número de funcionários não acompanha a redução das receitas fiscais, gerando problemas de endividamento aos governos locais. A razão para esta rigidez reside no facto de ao reduzir-se o número de funcionários poder estar a gerar-se um processo de redução progressiva dos serviços públicos fornecidos, espiral que agudizaria o processo de abandono da população. Usando o exemplo da Alemanha e da Polônia, o autor conclui que os governos locais têm uma reduzida capacidade para se adaptar, no curto-prazo, às implicações orçamentais que resultam da diminuição da população residente.

Apesar de não haver nenhuma teoria que permita antever como os governos locais reagem à perda de receita por via da redução do número de residentes, o tema do impacto da perda de receitas públicas nos orçamentos municipais tem merecido, nos anos mais recentes, uma atenção especial na sequência da crise imobiliária que afetou os Estados Unidos e a Europa. Doerner e Ihlanfeldt (2011) identificam que, para os EUA, o decréscimo do valor da propriedade pode não ter qualquer impacto nas receitas da propriedade dos governos locais porque, como Alm et al. (2011) mostram, os governos locais tendem a compensar a redução na base do imposto aumentando a taxa de incidência. Lutz et al. (2011) obtêm os mesmos resultados mas identificaram, adicionalmente, que o efeito nos orçamentos dos governos locais resultantes da redução do valor da propriedade ocorre com pelo menos três anos de desfasamento.

Chernick et al. (2011) e Skidmore e Scorsore (2011), para o contexto americano, tentam perceber como os governos locais podem conseguir manter os níveis de provisão de bens públicos locais e a “saúde” orçamental, dispondo tendencialmente de menos recursos. Estes trabalhos prevêem que os governos locais afetados pela recessão imobiliária, dada a perda de receitas sobre a propriedade, às quais se adiciona uma redução nas transferências intergovernamentais, observarão um decréscimo da despesa por habitante. Este decréscimo é importante porque só será concretizável por duas vias: ou redução da qualidade ou do nível de serviços públicos prestados, implicando, no último caso, uma eventual reconfiguração de algumas redes de serviços.

Há ainda outra área de investigação com implicações para as finanças locais: a alteração da composição etária dos residentes, mesmo admitindo crescimento da população (Strömberg, 2006; Seitz, 2007; Hofmann et al., 2008). Strömberg (2006), usando os municípios da Suécia, mostra que o aumento da proporção de idosos na sociedade origina um acréscimo de 7% da despesa pública preferida por aquele escalão etário. Seitz (2007), para o caso alemão, identifica que a alteração da composição demográfica faz aumentar ligeiramente a despesa pública em prole dos idosos mas não altera a despesa pública orientada para os jovens em idade escolar. Hofmann et al. (2008) referem, no entanto, também para a Alemanha, que o enviesamento da despesa pública a favor dos idosos depende do nível de governo.

Embora existam estudos que debatam as implicações orçamentais para os governos locais resultantes da perda de receitas, a investigação das implicações decorrentes da redução do número de habitantes é, no entanto, escassa, sendo Koziol (2004) uma das poucas exceções. Alm et al. (2011) referem que um dos fatores que mais impacto tem nas finanças locais é exatamente a redução do número de residentes numa jurisdição. Seitz e Kempkes (2007) identificam, em conformidade, para o caso da Alemanha, que a redução em 1% da população tem um efeito da mesma magnitude nas receitas dos governos locais. Em simultâneo, a redução no número de residentes numa jurisdição levanta igualmente um conjunto de diversos desafios aos governos locais, criando a existência de serviços públicos sobredimensionados. No entanto, como Hoornbeek e Schwarz (2009) referem, o redimensionamento dos serviços públicos é contra-natura porque a expectativa dos governos locais é, no futuro próximo, conseguir voltar a crescer.

Simultaneamente algumas das infraestruturas não são possíveis de subdividir em unidades de menor dimensão, pelo que o seu custo cresce quando a procura diminui. Para além disso, segundo Schiller e Siedentop (2006), as infraestruturas de abastecimento de água e saneamento são muito difíceis de redimensionar com a redução do número de habitantes, o que implica que a manutenção da sua provisão com qualidade só será viável, a prazo, com crescente fluxo de transferências intergovernamentais. No entanto, sempre que se recorre a processos de redistribuição compromete-se a correspondência entre beneficiário do serviço público e o seu contribuinte, acentuando enviesamentos na dimensão e na composição da despesa, sacrificando os objetivos de eficiência preconizados no princípio da equivalência fiscal de Olson (1969).

Paralelamente os governos locais confrontam-se com a incapacidade de ajustar a provisão do serviço público às necessidades da população que permanece, geralmente a população mais idosa, criando um desalinhamento entre procura e oferta de serviços. A oposição por parte dos governos locais em enviesar a composição da despesa a favor da maioria dos residentes, tendencialmente mais idosa, significa rejeitar a inevitabilidade de não voltar a ser atrativo. A expectativa de crescimento futuro torna os governos locais resistentes a reduzir a dimensão de infraestruturas. A manutenção de escolas, é um bom exemplo, mesmo quando a sua população jovem está claramente em regressão, isto porque desinvestir naquele setor significaria acentuar o processo de abandono das famílias que procurariam outra jurisdição vizinha, com melhores condições escolares, tipicamente também com mais recursos financeiros. Este comportamento é racional dado que, segundo Epple et al. (2010), os principais fatores para a escolha de residência são a proximidade a boas escolas e a disponibilidade de emprego. É por esta razão que em países como a Alemanha, certos municípios, com preponderância de população idosa, mantêm propositadamente determinadas infraestruturas sobredimensionadas, nomeadamente escolas e jardins de infância (Sedlacek, 2007; Montén e Thum, 2010).

Geys et al. (2007) referem que os efeitos da perda de população não são indiferentes à dimensão da jurisdição, registrando as jurisdições de pequena dimensão uma vulnerabilidade superior às pressões para o aumento da despesa pública. Assim, os efeitos resultantes da redução da procura nos custos das infraestruturas deverão ser analisados a uma escala micro. Schiller (2007) propõe uma metodologia para calcular os acréscimos de custos e, consequentemente, na despesa pública resultantes da diminuição da população, reconhecendo que é ainda necessária mais investigação nesta área.

3.     Governos locais em Portugal

Portugal é descrito pelas entidades internacionais (FMI, OCDE) como um país predominantemente centralizado, estando o poder de decisão orçamental muito concentrado no governo central. Com exceção das duas regiões autónomas: Madeira e Açores, Portugal continental não dispõe de regiões com órgãos eleitos e capacidade de gerar e gerir receitas próprias. No Continente, coexistem, assim, apenas dois níveis de governo: o central e o local. O nível local é composto por governos locais eleitos que gerem as competências e os respetivos orçamentos dos municípios. O município é assim a divisão geográfica que delimita a actuação de cada governo local, designado por Autarquia ou Câmara Municipal.

Os governos locais dispõem de uma elevada autonomia para definir as despesas municipais, cumprindo um leque relativamente vasto de competências as quais compreendem vertentes tão diferenciadas como a rede viária, o saneamento, o policiamento, o desporto, a cultura, entre muitas outras. Em contrapartida, os municípios têm uma reduzida margem para definir as suas receitas, dado que o governo central estabelece os impostos que revertem para os governos locais, dispondo estes apenas de liberdade para fixar a taxa de alguns impostos, de entre um intervalo previamente estabelecido pelo governo central. A centralização da fixação da receita municipal enquanto a despesa pública é descentralizada tem reduzido o custo percebido da provisão dos bens e serviços públicos, estimulando a procura por despesa pública e o endividamento autárquico excessivo.

Existem 308 municípios em Portugal, 278 dos quais no Continente, sendo que apenas 117 dispõem de cidades dentro das suas fronteiras, ou seja só 42% têm a sede localizada numa cidade, estando, nos restantes casos, localizada em vilas. O Continente dispunha, em 2008, de 139 cidades. A maioria dos municípios com cidades tem apenas uma cidade, só havendo 16 municípios com duas ou mais cidades.

As cidades do Continente distribuem-se geograficamente entre 49 na zona Norte, 43 na zona Centro, 17 na zona de Lisboa, 19 na zona do Alentejo e 11 na zona do sul – Algarve. Nas cidades do Continente residiam, em 2006, último ano disponível, cerca de 3,8 milhões de habitantes, o que corresponde a cerca de 38% da população portuguesa. No entanto, se a análise for alargada aos municípios com cidades, o valor sobe para 81%, em 2001, e para 76%, em 2008, o que significa que cerca de 3/4 da população do Continente vive em municípios com cidades. Cada município com cidade tinha, em média, 66 mil habitantes, em 2008, e uma mediana de 41 mil habitantes, tendo o menor município Meda, na zona Centro – Beira Interior Norte, menos de 6 mil habitantes.

A maior cidade do Continente é a capital – Lisboa – com cerca de 510 mil habitantes, em 2006, seguida pelo Porto com 228 mil habitantes, e a menor é Miranda do Douro (na zona Norte – Alto Trás-os-Montes) com cerca de 1300 habitantes. As cidades do Continente têm uma média de 28 mil habitantes e uma mediana de 14 mil habitantes.

Dada a inexistência, numa base anual, dos dados populacionais das cidades, a análise incide na evolução populacional e da atividade económica dos municípios com cidades, para os quais existe um leque relativamente vasto de informação estatística. O município com a cidade de maior dimensão, em 1999, era Lisboa com 587 mil habitantes, seguido por Sintra com 345 mil habitantes e por Vila Nova de Gaia com 278 mil habitantes, correspondendo a 6,5%, 3,8% e 3% da população residente em municípios com cidades. Passado uma década, em 2008, continua a ser Lisboa o maior município com cidade, com menos de 490 mil habitantes, seguido pelos municípios de Sintra com 446 mil habitantes e de Vila Nova de Gaia com quase 313 mil habitantes, correspondendo a, 4,8%, 4,4% e 3,1% da população residente em municípios com cidades. Enquanto Lisboa perdeu, em 10 anos, 16,6% dos seus residentes, correspondente a 97,2 mil habitantes, Sintra, um município vizinho ganhou 29,2%, correspondente a mais de 100 mil habitantes.

O mesmo aconteceu com o Porto, a segunda cidade mais importante de Portugal, cujo município perdeu, numa década, quase 20% da sua população, a maior perda relativa do País, passando de 269, em 1999, para 216 mil habitantes, em 2008. Em contrapartida, o município de Vila Nova de Gaia, seu vizinho, ganhou 12,6% de novos habitantes. O município com cidade que mais cresceu em termos relativos – 37% – no Continente, em 10 anos, foi Albufeira, localizado no Algarve, tendo atraído mais de 10 mil novos habitantes.

A realidade dos 117 municípios com cidades é bastante diferenciada, repartindo-se em três tipologias, onde coexistem 63 municípios em crescimento demográfico com 27 municípios com declínio permanente da população e 27 municípios com declínio recente. Estes dados significam que 46,2% dos municípios com cidades do Continente estão a perder população. A Figura 1 apresenta os municípios com cidades que se enquadram em cada uma das três tipologias.

 

Figura 1 – Tipologias de municípios com cidades

 

Fonte: INE - Anuário estatístico e cálculos próprios.

 

A Figura 2 mostra a evolução da população dos municípios com cidades, num período de 10 anos, segundo a sua tipologia. A Figura 3 evidencia a relevância de cada tipologia de município, em 1999 e 2008. Ressalta que os municípios em expansão, embora representem pouco mais de metade do número de municípios com cidades, equivalem a uma parcela gradualmente superior da população residente, passando de 60% para 64%, no período em análise.

 

Figura 2 – Evolução da população


Fonte: INE - Anuário estatístico e cálculos próprios.

 

Figura 3 – Distribuição da população residente, segundo a tipologia, em 1999 e 2008

 

 

Fonte: INE - Anuário estatístico e cálculos próprios.

 

O movimento de saída de uns municípios para outros na sua vizinhança coloca novos desafios aos governos locais na gestão dos recursos escassos. Cada município ao gerir o problema de forma isolada, não consegue identificar soluções conjuntas, dada a inexistência de um nível de governo regional. Este problema é ainda mais relevante porque, segundo Barreira (2011), como a maioria das cidades localiza-se numa estreita faixa junto do litoral, a sua área de influência tende a ser pequena, incentivando um comportamento de competição na captação de novos residentes, o qual se traduz na réplica, em diversos municípios contíguos, do mesmo tipo de bens públicos. Em 2008 foram criadas as Juntas Metropolitanas de Lisboa e do Porto, as quais estarão em melhores condições para gerir cooperativamente este tipo de movimentos de residentes, evitando que cada município seja um jogador num jogo de soma nula. O encontrar de soluções cooperativas traduz, geralmente, um melhor resultado social. No entanto, os dados disponíveis ainda não permitem identificar se uma abordagem coletiva do problema está a produzir resultados.

Para além do número de habitantes é igualmente importante perceber a sua composição, dado que os governos locais deverão escolher a despesa pública tendo em conta a estrutura etária da sua população. O índice de envelhecimento permite perceber que, embora a tendência geral seja para o seu crescimento, a preponderância de população idosa é particular relevante nos municípios em declínio persistente (ver Figura 4).

 

Figura 4 – Índice de envelhecimento

Simultaneamente, como se pode observar na Figura 5, a criação de emprego tem sido menor nos municípios com perda persistente de residentes, o que significa que o processo de declínio tem tendência a agravar-se, seguindo-se ao abandono da população o abandono da atividade econômica.

 

Figura 5 – Representatividade do emprego por conta de outrem gerado nos municípios com cidades

Fonte: INE - Anuário estatístico e cálculos próprios.

 

 

4.      Finanças locais dos municípios com cidades

4.1.                       As receitas municipais

Os municípios com cidades registraram, nos últimos dez anos, conforme se pode constatar pela Figura 6, comportamentos distintos: os municípios com crescimento da população observaram aumentos reais nas receitas municipais; enquanto os municípios com declínio persistente de habitantes registraram, nos anos mais recentes, algum decréscimo nas receitas; e os municípios com declínio recente observaram a estagnação das suas receitas.

  

Figura 6 – Receitas totais, a preços constantes, dos municípios com cidades

Fonte: INE - Anuário estatístico e cálculos próprios.

 

Embora esta seja a tendência geral das três tipologias de municípios com cidades, em cada tipologia há diferenças na evolução das receitas. Há municípios a perder e a ganhar receita em cada uma das tipologias de municípios, conforme se pode comprovar pela Figura 7. Apesar de, em termos globais, os municípios com crescimento da população registrarem uma variação positiva nas receitas municipais, há 18 municípios numa situação inversa. Adicionalmente há 7 municípios com declínio persistente e 6 municípios com uma redução recente no número de residentes, que se confrontam também com uma contração das receitas autárquicas.

As receitas municipais têm basicamente três origens: as transferências da Administração Central, os impostos ligados à detenção (IMI – Imposto Municipal sobre Imóveis) e transação da propriedade (IMT – Imposto Municipal sobre Transações) e outras receitas, de onde se destacam os fundos comunitários e o recurso ao endividamento.

No que se refere às transferências da Administração Central para os governos municipais constata-se, pela Figura 8, uma redução da relevância das transferências para os municípios com cidades. No entanto, quando a análise é por habitante (Figura 9) ressalta que essa quebra é acentuada nos municípios com declínio persistente. Este resultado confirma que o número de residentes tem um impacto, que não é imediato, nas transferências para os municípios porque os indicadores que compõem a fórmula de cálculo das transferências dependem, direta ou indiretamente, do número de habitantes.

Figura 7 – Variação das receitas totais por tipologias de municípios com cidades


Fonte: INE - Anuário estatístico e cálculos próprios.

 

Figura 8 – Representatividade das transferências da Administração Central por tipologia de municípios, a preços constantes

Fonte: INE - Anuário estatístico e cálculos próprios.

 

Figura 9 – Transferências da Administração Central por habitante, por tipologia de municípios, a preços constantes

 

Fonte: INE - Anuário estatístico e cálculos próprios.

 

Os impostos sobre a propriedade dividem-se entre os que incidem sobre a sua posse (IMI) e sobre a sua compra (IMT). Como se pode constatar pelos Gráficos 10 e 11 as receitas municipais provenientes do IMI cresceram no período analisado. O crescimento real das receitas do IMI ocorre mesmo nos municípios com perda de residentes, porque contrariamente ao que aconteceu com dos demais municípios, o valor da propriedade tem vindo a aumentar, inclusive no ano de 2008, ano da crise imobiliária, após uma ligeira inflexão entre 2004 e 2005 – ver Gráfico 12. O incremento daquelas receitas, para aqueles municípios, foi significativo, uma vez que representam 17% do seu orçamento, em 2008, quando, em 1999, a sua representatividade era de apenas 9%.

 

Gráfico 10 – Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI), a preços constantes


Fonte: INE - Anuário estatístico e cálculos próprios

 

Gráfico 11 – Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) por habitante, a preços constantes

Fonte: INE - Anuário estatístico e cálculos próprios

A crise imobiliária de 2008 teve, no entanto, um impacto imediato na parcela do imposto da propriedade associado à sua transação, conforme se pode constatar no Gráfico 13, sendo o impacto mais significativo nos municípios com cidades em expansão.

Quando os dois impostos sobre a propriedade são analisados (Gráfico 14) destaca-se que os municípios com declínio persistente da população não perderam em termos reais receitas porque compensaram as perdas via IMT com o IMI.  

 

Gráfico 12 – Valor real médio dos fogos transacionados

Fonte: INE - Anuário estatístico e cálculos próprios

 

Gráfico 13 – Imposto Municipal sobre as Transações (IMT), a preços constantes

Fonte: INE - Anuário estatístico e cálculos próprios

 

Gráfico 14 – Impostos sobre a propriedade, a preços constantes

Fonte: INE - Anuário estatístico e cálculos próprios

 

As outras receitas – Gráfico 15 – indicam um comportamento similar entre as várias tipologias de municípios até 2006. A partir daí os municípios em expansão ou com declínio recente observaram um crescimento das outras receitas, enquanto os municípios em declínio persistente registaram uma redução. Esta evolução ficou a dever-se ao facto de parte destes municípios, nomeadamente Lisboa, Amadora e Barreiro, que absorvem, em 2008, 57% das outras receitas dos municípios com declínio persistente, terem transitado, no âmbito do Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN) do Objetivo Convergência para o Objetivo Competitividade, o que implicou para aquelas autarquias, a partir de 2007, um menor acesso a fundos comunitários para financiamento dos seus projetos.

 

Gráfico 15 – Outras receitas, a preços constantes

Fonte: INE - Anuário estatístico e cálculos próprios

 

Dos 54 municípios com cidades com perda de população, 13 registaram, nos últimos 10 anos, uma redução nas receitas municipais, o que significa que apenas cerca de ¼ das Autarquias com menos população viram o seu orçamento ficar mais “curto”. Em 10 desses municípios houve uma redução real das receitas provenientes das transações imobiliárias (IMT), em 6 das transferências da Administração Central e em 2 de outras receitas de onde sobressai o recurso ao endividamento. As duas tabelas do Quadro 1 mostram os valores mais relevantes das taxas de variação, em termos reais, por categoria de receita, entre 1999 e 2008, respetivamente, nos casos de perda persistente e de perda recente de habitantes.

Quando a análise incide sobre os municípios que embora perdendo residentes não encontram refletida essa evolução nas suas receitas, constata-se que, na maioria dos casos, isso deve-se ao aumento significativo das transferências da Administração Central. Este crescimento real permitiu que, mesmo municípios com perdas significativas associadas à transação da propriedade (IMT) – 10 dos municípios com declínio persiste e 13 dos municípios com declínio recente, não registassem redução nos seus orçamentos, via compensação introduzida através daquelas transferências. Apenas 8 dos municípios com perda de residentes, repartidos equitativamente pelos dois tipos de declínio, tiveram de recorrer ao endividamento para cobrir perdas nas receitas sobre a transação da propriedade. Coimbra, Amadora e Portalegre eram, por exemplo, segundo Carvalho et al. (2008), respetivamente, o 18º, o 25º e o 34º município do País com maior passivo exigível (dívidas). A estes dados acresce que Castelo Branco foi o 29º município cujo passivo exigível, entre 2007 e 2008, mais aumentou.

Este resultado é significativo porque evidencia que a perda de residentes não se tem traduzido em perda de orçamento para a maioria dos municípios, uma vez que o mecanismo de transferências tem colmatado a perda de receitas associadas à transação do patrimônio. Na ausência daquelas transferências, o Quadro 2 mostra que 28 municípios dos 54 com declínio da população, correspondendo a mais de 50% dos municípios nestas condições, teriam visto os seus orçamentos estabilizar ou mesmo decrescer, caso não aumentassem o seu nível de endividamento.

 

Quadro 1 – Causas para a redução da receita em municípios com perda persistente e com perda recente de população

Fonte: INE - Anuário estatístico e cálculos próprios.

 

Quadro 2 – Causas para o aumento da receita em municípios com perda persistente e com perda recente de população

Fonte: INE - Anuário estatístico e cálculos próprios.

 

1.1.                       As despesas municipais

Em termos agregados os municípios com perda persistente de residentes têm vindo, gradualmente, a reduzir a despesa pública, quer em termos absolutos (Gráfico 16), quer por habitante (Gráfico 17), evidenciando algum esforço de consolidação orçamental, sendo aquela redução de 8,5% no período considerado, quando a receita havia decrescido 16,4%.

 

Gráfico 16 – Despesa total, a preços constantes

Fonte: INE - Anuário estatístico e cálculos próprios.

 

 Gráfico 17 – Despesa total por habitante, a preços constantes

Fonte: INE - Anuário estatístico e cálculos próprios.

 

No entanto, a redução da despesa nos municípios com perda persistente de habitantes ficou a dever-se à contração realizada por cinco municípios: Meda, Trancoso, Amadora, Lisboa e Barreiro, enquanto os demais municípios registraram acréscimo na despesa. O efeito total é de uma diminuição na despesa total porque os cinco municípios representam 54% da despesa realizada pelos municípios com perda persistente de população. O número de municípios decresce para apenas quatro quando a análise incide sobre a despesa por habitante, os últimos dos cinco acima referidos. Dos 27 municípios com declínio recente de população, apenas um (Loures) reduziu a despesa. Estes resultados são preocupantes porque dos 13 municípios com perda de residentes e uma evolução negativa nas receitas, apenas 6 iniciaram o processo de ajustamento à nova realidade: convivência com orçamentos autárquicos de menor dimensão.

Como não existe informação estatística das despesas realizadas pelos municípios por funções, não se consegue identificar, de forma direta, qual ou quais as categorias de despesas que registraram alterações: as mais orientadas para as necessidades dos jovens ou dos idosos. Tendo em vista obviar a falta dessa informação são estimados dois modelos com dados em painel: um com os municípios onde a despesa por habitante decresceu e outro com os municípios onde cresceu. O objetivo é perceber como a despesa dos municípios com declínio persistente da população foi afetada pela alteração da estrutura etária dos seus residentes, averiguando-se se há fundamento, como previsto pela literatura, para a afirmação de que a predominância de população idosa não altera proporcionalmente a despesa pública. Para tal estimam-se modelos com efeitos fixos com ponderação das cross-sections e com estimativas consistentes White heterocedásticas dos erros e covariâncias.

A variável dependente considerada é a despesa total por habitante e as varáveis independentes são o número de jovens com menos de 15 anos, os idosos com mais de 65 anos e a população empregada por conta de outrem. Todos os valores foram transformados em logaritmos naturais para permitir a análise como elasticidades.

As melhores estimativas são obtidas quando o número de jovens e de idosos são defasados temporalmente, respectivamente, quatro e três períodos e quando o número de trabalhadores é defasado um período. A correspondente função estimada é:

 

O primeiro modelo estimado compreende quatro municípios, aqueles com redução da despesa por habitante – Trancoso, Amadora, Lisboa e Barreiro – entre 1999 e 2008. O Quadro 3 sistematiza os principais resultados. Os coeficientes estimados permitem afirmar, para este número reduzido de municípios, que, como esperado, os efeitos da redução do número de jovens e do aumento de idosos não são semelhantes. Uma redução de 1% no número de jovens gera uma quebra na despesa inferior a 1%, enquanto um aumento de 1% no número de idosos implica uma contração da despesa por habitante de 1,28%.

 

Quadro 3 – Estimativas dos factores que afectam a despesa por habitante nos municípios com declínio persistente de habitantes e com redução nas despesas.

  * Estatisticamente significante a 1%

 

É ainda de destacar que a escolha da composição da despesa municipal tem em conta os dados demográficos defasados, o que significa que as políticas públicas não respondem automaticamente à evolução da população. No entanto, esta capacidade de reação é superior quando se considera a evolução no emprego, sendo a ação política decidida com o desfasamento de apenas um ano. Embora não seja estatisticamente significativo, constata-se que a despesa pouco se modifica com as alterações no mercado de trabalho.

O segundo modelo estimado corresponde aos municípios com declínio persistente da população, mas com crescimento nas despesas públicas. Neste caso são considerados 22 municípios (ver Figura em Anexo). Os coeficientes estimados são apresentados no Quadro 4.

Quadro 4 – Estimativas dos factores que afectam a despesa por habitante nos municípios com declínio persistente de habitantes e com aumento nas despesas

   * Estatisticamente significante a 1%

 

O decréscimo em 1% da população jovem aumenta a despesa pública em quase 1%. Em contrapartida, o aumento de 1% no número de idosos faz diminuir a despesa pública 1%. Há aqui claramente uma transferência da composição da despesa pública para um reforço da despesa em prole dos jovens, numa tentativa, já anteriormente identificada, de tentar contrariar o abandono das famílias daqueles municípios.

Acresce que, para estes municípios, a criação de emprego induz um crescimento ligeiramente superior na despesa pública, em comparação com os 4 municípios anteriormente analisados, embora o impacto seja relativamente pequeno (cresce 0,18% para uma variação percentual no emprego).

Estes resultados estão em conformidade com o previsto pela literatura, confirmando o que acontece noutros países em que os governos locais não aceitam o decréscimo da população, mantendo infraestruturas orientadas para os jovens, dimensionando-as acima das necessidades dos residentes. Esta estratégia pretende cativar para o município novos residentes, enviesando, dessa forma, a composição da despesa a favor da população mais jovem, apostando, por exemplo, na criação de creches e jardins de infância e na manutenção em funcionamento de escolas. O aceitar do declínio da população implicaria um enviesamento da despesa a favor dos idosos, proporcionando-lhes serviços e infraestruturas orientados para as suas necessidades. Os resultados indicam exatamente o oposto. O envelhecimento da população faz decrescer a despesa pública enquanto a diminuição do número de jovens a faz aumentar ou diminuir menos.

Os Gráficos 18 e 19 mostram que as escolas, mesmo as dos municípios a perder consistentemente população, atraem alunos, uma vez que as escolas continuam dimensionadas para uma capacidade acima do número de residentes. Estes dados indicam que estas escolas são mais atrativas do que a de outros municípios, com expansão no número de jovens, mas sem cidades. As razões prováveis são a percepção da população de que as escolas localizadas nas cidades terão uma qualidade superior ou a conveniência dos pais, que trabalhando nas cidades, trazem os seus filhos para o município do emprego, não os inscrevendo nos municípios de residência.

 

Gráfico 18 – Alunos a frequentar o ensino básico

Fonte: INE - Anuário estatístico e cálculos próprios.

 

Gráfico 19 – Alunos a frequentar o ensino secundário

Fonte: INE - Anuário estatístico e cálculos próprios.

 

 

1.      Conclusão

Aprender a crescer mais pequeno é uma tarefa difícil para os governantes locais – Autarcas – sendo preferível adiar o inevitável, sempre que isso seja possível. A percepção geral é de que aceitar o declínio de habitantes e a consequente perda de receitas é aceitar uma derrota, algo que o político eleito tem, racionalmente, tendência a evitar, para garantir a sua sobrevivência política. Como a revisão de literatura fazia antever a redução na receita nos municípios com cidades em Portugal Continental não é acompanhada pela redução na despesa porque os governos locais resistem a aceitar o declínio da população, mesmo quando este é um fenômeno persistente, apostando em estratégias que visam captar novos residentes. A rigidez de alguns custos associados à provisão de certos serviços públicos e infraestruturas também contribui para o desajustamento entre receitas e despesas municipais.

A convivência com a perda de residentes, como se ela não existisse, tem implicações para a saúde orçamental dos municípios, dado que os governos locais tendem a substituir o decréscimo das receitas associadas à transação da propriedade por crescentes solicitações de transferências junto da Administração Central e pelo endividamento. Este comportamento conduz a espirais de défices persistentes. No entanto, o status quo das finanças locais dos municípios com cidades com perda de população, assente no recurso ao governo central ou à banca, não pode ser mantido. A actual crise da dívida e, muito em particular, a intervenção externa, consubstanciada no apoio do FMI/FEEF (Fundo Monetário Internacional/Fundo Europeu de Estabilização Financeira) a Portugal, o qual vai impor que as transferências para os municípios decresçam 350 milhões de euros entre 2012 e 2013, irá obrigar os municípios a acomodar nas suas decisões o convívio com orçamentos mais curtos e, consequentemente, a ter de contrair a evolução da despesa.

Será necessário proceder a mais investigação para averiguar o impacto da crise imobiliária nos orçamentos municipais, só possível de avaliar quando tiverem disponíveis dados estatísticos sobre as Finanças Locais a partir de 2009, bem como o impacto da contração imposta pela ajuda externa, com efeitos a partir de 2012. Apenas com essa informação será possível validar os resultados encontrados de enviesamento na composição da despesa pública em prole dos jovens, numa tentativa de inversão do processo de abandono dos residentes.

A expectativa dos governantes é que o crescimento futuro torne desnecessário proceder ao downsizing nos serviços e infraestruturas públicas. No entanto, o inevitável convívio dos governos locais com orçamentos mais reduzidos determinará, num futuro próximo, uma reavaliação do seu comportamento em termos de orientação da composição da despesa, não sendo sustentável a manutenção de estratégias de competição por uma crescente proporção de residentes jovens, quando a evolução previsível da estrutura etária em Portugal é para o acentuar da inversão da pirâmide etária.

 

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Anexo:

Municípios com cidades e declínio persistente da população, cuja despesa por habitante cresceu entre 1999 e 2008

 

 

 

 

 

 

 

Segregação Residencial: efeito da expansão geográfica do capital no espaço urbano brasileiro[1] 

  

 

Valéria Grace Costa

  

 

Introdução

A compreensão do processo de produção e reprodução do espaço urbano e da segregação residencial passa pela análise das principais características do novo imperialismo. Neste sentido a releitura da obra de Marx por alguns autores como Harvey (2004;203;1982), Lefebvre (2001), Valença (2008) nos traz contribuições importantes para a explicação dos efeitos do neoliberalismo em países do capitalismo periférico como o Brasil ao transportarem para o pensamento geográfico algumas noções marxistas. Entre estas noções destacamos o processo de acumulação por espoliação ou de expansão geográfica do capital como fio condutor da análise que segue. Desta forma, pretende-se mostrar, a partir da  literatura, os principais efeitos do processo de acumulação, via espoliação e do passado colonial na formação de um espaço urbano brasileiro desigual e excludente, considerando que se trata, no caso do Brasil, de país da periferia do capitalismo e portanto lócus dos piores efeitos da acumulação via espoliação:        

“Embora eu não julgue que a acumulação por espoliação esteja exclusivamente na periferia, é indubitável que algumas de suas manifestações mais viciosas e desumanas ocorrem nas regiões mais vulneráveis e degradadas do âmbito do desenvolvimento geográfico desigual (Harvey, 2003,  p. 142)”.

 

É através da “dinâmica do imobiliário” [3] que diversos agentes participam da partilha do espaço urbano, produzindo a segregação residencial como um dos maiores, senão o maior aspecto de materialização e visibilidade das contradições oriundas tanto do passado colonial como do presente neoimperialista. A segregação residencial compreendida, neste caso, como a separação das classes sociais no espaço[4], produzindo, de um lado áreas que agregam pessoas de maiores status sociais e de outro, áreas que agregam grupos socialmente mais desfavorecidos. Neste último caso representam a face da segregação residencial da  pobreza que é  materializada no espaço urbano sob diversas formas de habitação como favelas, loteamentos irregulares, bairros populares, entre  outros tipos de assentamentos precários formais ou informais.

Embora a favela constitua apenas uma das formas habitacionais que abriga predominantemente população com “carências diversas como subconsumo, baixos níveis educacionais, subemprego e insuficiente integração na sociedade”[5] (Rocha, 1998), ela representa um dos principais símbolos da segregação residencial e da pobreza urbana[6].

Com a finalidade de tentar demonstrar um dos efeitos da expansão geográfica do capital no espaço urbano brasileiro, serão utilizados para complementar a análise os dados do Censo Demográfico 2000, referentes à população total e a residente em setores especiais do tipo aglomerados subnormais[7]. Estes setores especiais, que formam assentamentos informais, recebem denominações diferenciadas, cujas designações se devem tanto a questões regionais e/ ou culturais, como às suas características peculiares. Assumem nomes e formas diferenciadas no território brasileiro como favelas (Rio de Janeiro) vilas ( Minas Gerais, Porto Alegre), mocambos ( Pernambuco), palafitas ( estados da região norte e Salvador), invasões ( Belém, Brasília), malocas ( Nordeste), alagados ( Bahia), baixadas  ( Bahia, Belém), áreas de baixa renda, comunidades ( Rio de Janeiro ) entre outras denominações.

 No decorrer do texto será utilizado e privilegiado o termo favelas e assemelhados[8] para designar todas estas formas de assentamentos, tendo em vista que constitui ainda hoje o termo mais utilizado tanto no Brasil como no exterior para designar essas áreas e ainda por representar um dos símbolos da segregação residencial da pobreza e das grandes questões urbanas , conforme comentado anteriormente.

 

Expansão geográfica do capital nos países do capitalismo periférico

            A noção de acumulação via espoliação, desenvolvida por Harvey (2003), traz contribuições importantes para a compreensão do processo de consolidação do espaço urbano brasileiro. Explica, assim, de que forma o novo imperialismo, através da expansão do capital constrói, destrói para depois reconstruir o espaço urbano.

Harvey aproxima o conceito de acumulação por espoliação com o de expansão geográfica.  Tal conceito pode ser visto como a atualização pelo novo imperialismo do conceito de acumulação primitiva do período colonial, tendo como diferença básica que agora há expansões geográficas muito mais diretamente associadas à urbanização e às novas formas de regionalização advinda da globalização atual (Harvey, 2003).

A expansão territorial se faz tanto numa escala global, com a expansão dos mercados em várias partes do mundo representando a incorporação de várias cidades na economia mundial, como na escala das cidades, a partir da expansão de  seus tecidos urbanos.  configurando no primeiro caso a dispersão e no segundo a concentração, conforme sintetizado por Valença:

 

“O resultado geral é uma tensão evidente entre as virtudes da concentração, que visa minimizar os efeitos da separação geográfica [...] e a dispersão geográfica, que tem a virtude de promover oportunidades para mais acumulação através da exploração de [novas] vantagens geográficas específicas (naturais e criadas)” (Valença , 2008, p.247).

 

O entendimento da acumulação via espoliação, entretanto, envolve outros conceitos como de resolução espacial (spatial fix) e de fundo de consumo (consuption found), ambos associados à noção de crise.

            A resolução espacial é definida como sendo “a qualidade que garante uma certa estabilidade ao sistema social e econômico, tanto no que diz respeito à produção quanto ao consumo. É  um atributo de todas as atividades humanas (id., p. 244)”.Tal resolução espacial é responsável tanto pela expansão do mercado como da produção e representa a saída para as crises de sobreacumulação típicas do novo imperialismo. Tais crises estão associadas à superprodução e não absorção desta mesma produção pelo mercado consumidor. Elas são necessárias e alimentam o sistema capitalista. Em crise, os excedentes passam a ser absorvidos através da expansão geográfica:

“A busca pela resolução espacial para o problema da sobreacumulação disseminou o desenvolvimento industrial em terras distantes e acarretou a recente conexão do industrialismo urbano a um sistema de lugares urbanos através do movimento de dinheiro, de capital, de mercadorias, de capacidade produtiva e de força de trabalho” (Harvey, 1989, p. 33 apud Valença, 2008, p. 247) ”.

 

Então a resolução espacial está ligada à idéia de saídas de crises cíclicas geradoras de desequilíbrio para posterior equilíbrio com a absorção dos excedentes através da expansão geográfica.

Portanto, a reconfiguração do espaço também requer as bases materializadas para tais expansões como o espaço de circulação (vias), de trabalho (meios de produção) , de vida (residências). Ao mesmo tempo prescinde da infraestrutura para o estabelecimento de tais bases, a qual é composta, entre outros, pelos serviços de saneamento e de comunicação. Desta maneira, o capitalismo “constrói uma paisagem geográfica distinta, (...) que facilita a acumulação de capital durante uma fase de sua história só para tê-la destruída e reconfigurada para abrir caminho para mais acumulação mais tarde (Harvey, 2000, p. 54)”.

No que se refere à reprodução da forca de trabalho, que  corresponde   ao espaço da habitação,  Harvey define-o como consuption fund ou fundo de consumo. Assima expansão territorial do capital, realizada em várias esferas, tem na produção imobiliária a correspondente para a expansão do habitat e ao mesmo tempo da segregação residencial.   

 

Além da expansão do mercado, um Estado mais liberal e a política de privatização também ajudam a compor a caracterização do novo imperialismo. A associação do Estado com o capital privado constitui um dos mais importantes fatores para a produção do habitat, que repercute  tanto qualitativamente nas características das moradias, como quantitativamente, considerando sua expansão no tecido urbano[9].

Outra característica importante que não deve deixar de ser ressaltada se refere à transformação do papel da cidade como  “produtora”. Se a produção no colonialismo estava associada ao campo, o capitalismo traz para a cidade esta função, incorporando a indústria como o principal meio de produção[10].

Alguns aspectos da obra de Lefebvre (2001) trazem contribuições importantes na discussão sobre a relação entre urbanização, industrialização e cidade e complementam as noções discutidas anteriormente, as quais tiveram como base o processo de acumulação via espoliação.  Entre tais aspectos podemos destacar a entrada da indústria na cidade e o crescimento urbano vindo posteriormente. As transformações que a cidade sofreu com a industrialização foram inúmeras tanto no que diz respeito às modificações físicas e sociais como no exercício de suas funções, significando o  período de transformações mais intensas. Neste sentido Lefebvre (2001) considera a indústria como o motor das transformações da sociedade. Esta importância é revelada pelo autor na relação que estabelece entre industrialização e urbanização ao delimitar o processo de industrialização como indutor da urbanização e como induzidos os problemas trazidos pela urbanização.

Há transformações em relação ao espaço do poder, do trabalho e de vida. O fortalecimento do estado é materializado neste espaço e a  separação entre Estado, sociedade e cidade fica mais nítida a partir de então. De forma semelhante há uma nítida separação entre o espaço do trabalho e o espaço da residência sobre esta mesma base[11] Tais transformações revelam contradições que a cidade capitalista industrial vai incorporando em sua existência.

      Sobre os efeitos da urbanização nas cidades Lefebvre generaliza como principais a implosão x explosão da cidade, tecido urbano cerrado; densidades gigantescas e deterioração de centros urbanos. Embora tais efeitos sejam comuns a inúmeras cidades, eles repercutem de forma diferenciada em suas configurações espaciais. A diferença é ainda mais significativa entre as cidades dos países desenvolvidos e as cidades dos paises do capitalismo periférico.

Os centros urbanos sofrem transformações no decorrer da história que não são necessariamente simultâneas entre si. Eles passam por momentos de obsolescência x crescimento; valorização x desvalorização; ascensão x queda, formando ciclos tal como colocado por Harvey ao se referir à necessidade do capital “construir, destruir e reconstruir”, conforme abordado anteriormente.   

Os problemas da expansão capitalista também foram abordados por Francisco de Oliveira (1977) ao definir o urbano como síntese ou reflexo deste processo, com destaque para o caso brasileiro:

      “no urbano começam a sintetizar-se, em qualquer direção, os problemas da expansão do capitalismo no Brasil, na forma da estruturação oligo-monopolisita fortemente interpenetrada pelo Estado. Não há praticamente qualquer dimensão da vida nacional que não se reflita imediatamente num problema urbano ou num problema que explode como urbano (Oliveira, 1977, p. 68)” ; “A urbanização da economia e sociedade brasileira nada mais é senão a extensão a todos os recantos e setores da vida nacional, das relações de produção capitalistas (id., p. 74)” ·.

 

            A idéia de articulação de todos estes elementos na constituição do urbano também é clara na passagem em que o autor considera  que pode ser vista  como resultado de uma articulação global  “a maneira dos rios subterrâneos (ibid., p. 68)”.

O ápice deste processo no Brasil acontece entre 1950 e 1980[12], quando as contradições ficam também mais evidentes. Tal momento é caracterizado pelo autor como a emergência do “novo urbano”. O urbano nesse período é a afirmação da sede urbana da produção e do controle político social e ao mesmo tempo a negação do campo (ibid. , p. 72). O autor caracteriza nas passagens seguintes o novo urbano:

“mas o novo e a conversão da agricultura em indústria, no sentido mais rigoroso do termo, a conversão  da riqueza nacional em pressuposto geral do capitalismo, a captura do estado pela burguesia internacional-associada, a dissolução da ambigüidade do estado que fundava a própria possibilidade de um Estado (...). Nestas condições todo e qualquer problema no Brasil é um problema urbano (ibid, p. 73);

Na passagem a seguir, de Francisco de Oliveira, podemos dizer que há uma síntese de toda a discussão levantada anteriormente a partir de Harvey e de Lefebvre sobre a expansão geográfica do capital, as transformações da cidade envolvendo o papel do estado e a redefinição do seu próprio espaço:

“Se a cidade foi o espaço por excelência do conflito de classes entre a burguesia e o proletariado, a urbanização da economia e da sociedade amplia este espaço; se essa urbanização  tem no estado capturado pela burguesia internacional associada seu principal agente e simultaneamente seu principal obstáculo, esse espaço não apenas se amplia: se redefine para colocar no centro da contradição o próprio Estado (ibid, p. 75)”.

 

Seguindo esta linha de discussão, podemos prosseguir tratando de forma mais especifica  os problemas históricos das sociedades capitalistas dependentes de origem colonial  na qual o Brasil está inserido. Neste sentido é importante a análise de Sampaio Jr.(2001)  na medida em que desenvolve sua argumentação considerando o efeito do passado colonial  e do novo imperialismo  na formação da sociedade e do espaço brasileiro. Mostra que tais forças são ao mesmo tempo aliadas e contraditórias. Elas são representadas de um lado pelas forças modernas, típicas do novo imperialismo, e de outro, pelas forças tradicionais, resquícios da colonização. Explica assim que as condições de subdesenvolvimento dos paises de passado colonial é produto deste passado, do presente e  das relações internas e externas que constituem estes dois momentos. 

Desta maneira, os padrões de dominação da elite colonial convivem com os padrões de dominação das elites capitalistas. Se a primeira tinha como eixo de dominação a exploração da terra e do trabalho na mesma, a segunda vai se ligar  na exploração do operário e no seu consumo.

A simultaneidade de vários sistemas e tempos históricos, registrados na sociedade e nos vários espaços brasileiros constitui elemento importante para a compreensão do processo de estruturação do espaço urbano brasileiro e as contradições inerentes ao mesmo. Assim, a tecnologia convive com o arcaico e a riqueza com a pobreza. Há também a coexistência de diversos níveis socioculturais. Sampaio Jr. (2001) ressalta o papel do colonialismo cultural como um dos fatores que contribuem para exacerbar as condições de subdesenvolvimento. Ele explica de que forma tal antagonismo emperra o projeto de construção da nação:

“De um lado, ao estimular a formação do mercado interno, a evolução do capitalismo reforça as tendências que levam a autonomização da economia nacional; de outro, ao perpetuar a exclusão social e a instabilidade econômica, a relação de dependência exacerba as contradições entre o movimento de acumulação do capital e o processo de integração nacional, criando antagonismos que tornam a sobrevivência do capitalismo dependente  cada dia mais difícil (...) Por esse motivo, as nações emergentes da periferia do sistema capitalista mundial caminham sobre o fio da navalha, equilibrando-se entre tendências que empurram a sociedade em direção ao desenvolvimento autodeterminado e forças que a ameaçam com o espectro de reversão neocolonial (Sampaio Jr., 2001, p. 206)”.

 

As diferenças quanto ao tipo de dependência são ressaltadas ao considerar  que no colonialismo os laços de dependência eram formais e no neo-imperialismo tais nexos de dependência se dá mais “pelo forte condicionamento que o sistema capitalista mundial exerce sobre o desenvolvimento das economias periféricas (id., p. 207)”.

O autor mencionado anteriormente utiliza como eixo de sua discussão, na qual apóia as demais argumentações, as idéias conflitantes de formação da Nação e de persistência da Barbárie. Os aspectos associados ao primeiro caso  se relacionam  ao desenvolvimento, à  tecnologia, à riqueza; e ao segundo caso, os sentidos opostos,  ligados   à desigualdade, pobreza,  segregação residencial, subdesenvolvimento.

Assim, conforme vimos, o conhecimento da natureza das contradições entre a situação de dependência e o processo de construção da nação constitui o núcleo central de toda a reflexão sobre o caráter do desenvolvimento capitalista nas regiões periféricas e subdesenvolvidas (ibid., p. 206).

Em continuidade à discussão empreendida até aqui, procuraremos focalizar, no item seguinte, a análise de um dos efeitos perversos da expansão geográfica do capital[13]: a segregação residencial. 

 

 Segregação residencial: efeito perverso[14] da expansão geográfica do capital

O corte temporal que podemos arriscar como percussor das grandes transformações no espaço brasileiro coincide com o final da segunda Guerra onde começam a ser fortalecidas as bases para este novo momento. È a partir daí, e mais especificamente a partir da década de 1970, que tais efeitos do Novo Imperialismo,  se generalizam e se espraiam para todo o território brasileiro.  A disseminação da indústria como meio de produção predominante tem um papel fundamental na consolidação e supremacia do “urbano”. Há o aumento do número de cidades grandes e médias, as redes de cidades consolidam-se e se fortalecem deixando marcas materiais e imateriais irreversíveis no espaço.

As cidades vão perdendo aos poucos suas primazias e a localização da pobreza urbana, através principalmente das formas de habitação de baixa renda[15] , como as favelas, vai deixando de ser privilégio das poucas cidades do sudeste que outrora concentravam a principal força produtiva e empregos.   Tal aspecto foi abordado por Costa (2007) ao avaliar simultaneamente a distribuição espacial da população urbana e da população residente em favelas.  Neste estudo a autora mostra que a distribuição espacial deste tipo de assentamento acompanha o padrão de distribuição da população urbana no Brasil, conforme ilustrado no mapa 1:

 

Para avaliação da distribuição das favelas no Brasil e sua relação com a urbanização foram utilizados os números absolutos e relativos de população total e da residente em favelas, assim como o número de municípios, que segundo o IBGE, possuíam esta forma de assentamento em 2000.  

As informações mencionadas anteriormente foram relacionadas com o grau de urbanização de cada município (tabela 1) e estratificação dos municípios por tamanho populacional (tabela 2).

A tabela 1 faz a correspondência entre o número de municípios com favelas de acordo com a classificação de tais municípios segundo as respectivas Taxas de urbanização[16].

 

A análise das taxas de urbanização nos municípios que, segundo o censo 2000 possuíam favelas e assemelhados[17] evidencia a predominância absoluta daqueles que apresentam alto índice de população urbana sobre os demais, conforme podemos visualizar na tabela 1.

Dos 225 municípios com este tipo de assentamento, 187 possuem taxa superior a 80% de população urbana.  Deste subconjunto, entre os mais urbanizados, 114 apresentam taxa superior a 90%, sendo que desses, 38 são 100% urbanos.

O outro aspecto, referente ao movimento simultâneo de dispersão e concentração, também pode ser ilustrado a partir da tabela que relaciona o tamanho populacional dos municípios, a população residente total e aquela residente em favelas. Se está havendo uma dispersão da urbanização e da favelização no espaço brasileiro com o aparecimento de novas favelas e crescimento das já existentes em municípios de porte médio, há ao mesmo tempo um processo de concentração nas grandes cidades e regiões metropolitanas, conforme exemplificado na tabela 2, a qual mostra a distribuição da população total e da população em aglomerados subnormais em diferentes classes de tamanho da população dos municípios que possuem estes setores especiais. 

 

As informações revelam a importância que possuem os municípios de maiores portes populacionais no que diz respeito ao quantitativo de pessoas residentes nesse tipo de assentamento. No Brasil como um todo o percentual de população vivendo em cidades com mais de um milhão de habitantes correspondia, em 2000, a 47,2 % da população total, enquanto que no universo da população favelada este percentual é próximo de 57%.

O padrão apresentado na tabela 3 demonstra ainda que os municípios mais populosos, com mais de 100.000 habitantes, concentram a maior parte das favelas e da população nas mesmas. Segundo a mesma tabela, aproximadamente 96% da população favelada reside em municípios com mais de 100.000 habitantes, percentual bem maior do que aquele relativo à população total, correspondente a cerca de 51%, os quais  viviam em  cidades do mesmo porte.

Depois dos municípios com população superior a 1.000.000 de habitantes  a faixa compreendida entre 100.000 e 500.000 habitantes é a que concentra o maior número de municípios (91) com favelas, os quais  representam 40% do total de municípios com esse tipo de assentamento e  a segunda maior população em favelas, correspondendo ao percentual na ordem de 26 % .

A distribuição da população total e da população residente em aglomerados subnormais nos permite visualizar, respectivamente, a concentração da população e da pobreza, tanto nas grandes cidades e regiões metropolitanas como nas cidades médias. Se não temos a informação direta no caso das regiões metropolitanas, o quantitativo nos municípios acima de 1.000.000 de habitantes, os quais constituem núcleos de regiões metropolitanas, nos permite fazer tal aproximação.

Portanto, os números mostram que as cidades médias também vêm adquirindo importância tanto no que se refere ao aumento de sua população total como da residente em favelas.

A dispersão pode ser percebida a partir da observação do aumento do número de municípios nos extratos populacionais relativos aos municípios de porte médio[18], conforme estudo realizado por Andrade e Serra (2001) ao demonstrarem que em 1970 os municípios situados no extrato populacional entre 250.000 e 500.000 habitantes abrigavam 5,1 % da população total e em 2000 esse valor passa a corresponder a 10,6%, representando o dobro da participação em termos percentuais.

Os valores apresentados na tabela 2, tanto no que diz respeito à população total, quanto à população residente em aglomerados subnormais, podem confirmar a tendência mais recente de reestruturação do espaço urbano, indicada por Moura (2004), que produz em qualquer porção do território, uma face moderna, de alta renda e complexidade, e outra com características opostas. Tal aspecto contém as noções apresentadas anteriormente sobre as dicotomias do capitalismo dependente em torno da idéia que contrapõe os ideais de formação da Nação e da Barbárie, riqueza e pobreza, centralização e descentralização[19] . A passagem seguinte da mesma autora reforça este ponto de vista:

 “A situação das grandes e médias cidades  reflete o atual momento de reestruturação econômica ao passo que” ao mesmo tempo em que segue favorecendo a concentração, abre possibilidades de reforço a novas centralidades integrando espaços antes distantes da dinâmica de segmentos modernos de produção (Moura, 2004, p.  272) “.

 

Conclusão

A compreensão da formação da sociedade e do espaço brasileiro prescinde, conforme vimos, de uma análise do contexto histórico no qual o Brasil está inserido. Assim constatamos, a partir da visão dos autores analisados, que tal espaço é produto de um conjunto de forças e que a transposição do pensamento marxista para este entendimento é fundamental. Vimos que o conceito de acumulação por espoliação ou expansão geográfica do capital em contraponto ao processo de acumulação primitiva e ao colonialismo, trazem elementos do passado e do presente relevantes para  a explicação da atual configuração do espaço urbano brasileiro.  Também podemos constatar, embora tenha sido feito de forma incipiente, que é possível elaborar análises empíricas com base em informações censitárias para nos auxiliar na compreensão e visualização  da configuração do urbano brasileiro.  Assim podemos explorar a partir de estudos desta natureza os efeitos da expansão geográfica do capital tal como as dicotomias entre concentração x dispersão, desenvolvimento x subdesenvolvimento, equilíbrio x desequilíbrio, nação e barbárie, o moderno (tecnologia) e o tradicional, a pobreza e a riqueza, entre outros.  Na exploração destas ambigüidades, encontramos como um fio que as une uma das noções chaves levantadas por Harvey (2004 b), na qual considera que “o capitalismo constrói seu próprio outro”.

 

 

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[1] Texto elaborado a partir do trabalho apresentado no II Congresso Internacional do Núcleo de Estudos das Américas.Rio de Janeiro:UERJ. Setembro, 2010 sob o título Novo Imperialismo e o espaço urbano brasileiro.

[3] Ver a respeito Ribeiro e Lago (2000); E. Maricato (1996;2000) ; Harvey (2003);  Valença (2008) faz uma análise da dinâmica do imobiliário na obra de Harvey.

[4] Corrêa (1989) considera ainda que o entendimento de como as classes sociais são estruturadas é fundamental para a compreensão do processo de segregação residencial. A fragmentação das classes sociais reflete-se no espaço urbano por meio da segregação residencial, ou seja, da sua distribuição diferenciada. Tal rebatimento ocorre devido ao  diferencial da capacidade que cada grupo social tem de pagar pela residência que ocupa, a qual apresenta características diferentes no que se refere ao tipo e à localização. “ A segregação residencial é portanto uma expressão espacial das classes sociais”   (ibid, p. 61).

[6] Aspecto abordado por SOUZA (2003) e Davidovich ( 2000) ;

[7]  Setor especial de aglomerado subnormal é o “conjunto constituído por um mínimo de 51 (cinqüenta e uma) unidades habitacionais ocupando ou tendo ocupado, até período recente, terreno de propriedade alheia (publica ou particular), dispostos em geral, de forma desordenada e densa; e carentes, em sua maioria, de serviços públicos essenciais (IBGE, 2003)” . Tais setores são delimitados pelo IBGE por ocasião da fase de preparação do Censo, iniciada geralmente dois anos antes da operação censitária.

[8] São consideradas favelas e assemelhados, pela autora do presente texto, as unidades formadas   por um ou mais setores especiais do tipo aglomerado subnormal.

[9] Aspecto abordado na palestra da construtora Camargo Correia realizada como atividade curricular do Programa de pós Graduação da FAU/ USP em 2008.

[10] Para maiores detalhes sobre as diferenças entre as cidades dos dois períodos e sua descrição ver Lefebvre (2001).

[11] Ver também Harvey (1982).

[12] Aspecto também abordado por  Sampaio Jr (2001), conforme será  comentado posteriormente.

[13]A utilização do termo “perverso” é encontrada em obras de M. Santos(1978;2000) associando-o  aos efeitos da globalização como a segregação residencial e a pobreza..

 [15] Conforme comentado  na introdução deste artigo.

[16] Taxa de urbanização corresponde à relação percentual entre a população residente em área de situação urbana e a população total do município. O conceito é adotado pelo IBGE (disponível em www.ibge.gov.br/estatística/ população/ condiçãodevida/indicadoresminimos/conceitos), cuja fórmula pode ser representada da seguinte maneira: Taxa de urbanização = (população residente em áreas de situação urbana/ população total do município)* 100. 

[17] Sobre o significado de favelas e assemelhados, para a autora, ver nota 1.

[18] Não há consenso em relação à definição de municípios ou cidades de porte médio. Geralmente, no caso brasileiro, são considerados os municípios ou cidades situadas na faixa populacional que varia entre 100.000 a 500.000 habitantes. A respeito ver  Andrade & Serra (1998; 2001) e Amorim Filho (2002) . Sobre a  variação dos limiares demográficos referentes ao tamanho das cidades médias no Brasil, Amorim ressalta este fato em decorrência da característica de heterogeneidade do espaço brasileiro e ainda que  a escolha das classes de volume populacional depende dos objetivos particulares de cada estudo.

 [19]  Aspectos abordados anteriormente a partir de Harvey (2004;2003;1982) , Sampaio Jr (2001) e outros. 




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