Visualizar - Revistas | Chão Urbano

Chão Urbano

Chão Urbano ANO VI Nº 01 e 02 Jan e Fev 2006

01/01/2006

Integra:

 

ANO VI Nº 01 e 02 Jan e Fev 2006

 

Laboratório Redes de Infraestruturas e Organização Territorial - IPPUR/UFRJ  

 

      Coordenação Mauro Kleiman  

 

       Equipe:  Caroline Pires Cardoso,Maria Helena de Souza da Silva,Edinilson Pereira Costa, Simone Cavalcanti do Amaral e Viviane de Moraes Freitas.

 

 

 

Uma Persistência na área de Planejamento Urbano e Regional

 

 

Editorial:

 

Chão Urbano atinge seu sexto ano de publicação. Trata-se de um espaço de edição voltado para a discussão da temática da produção do Território em suas diversas dimensões e diferentes escalas, com ênfase na problemática das redes e sua relação com a estruturação das cidades e regiões. Chão Urbano é uma publicação, ela própria veiculada por um rede - a internet - que atinge, por esta razão, um âmbito internacional – que congrega hoje em sua lista de leitores pesquisadores, estudiosos, e interessados em sua temática – de vários países da América Latina, Europa e América do Norte. A publicação faz parte das atividades dos Laboratórios “Redes Urbanas – Redes de Infra-estrutura – Organização territorial” e “ Regiões Metropolitanas”, coordenados pelo prof. Mauro Kleiman. O Laboratório Redes Urbanas tem linhas de pesquisa sobre o papel e lugar das redes técnicas urbanas – principalmente de Água e Esgoto – na estruturação das cidades com foco especial sobre a questão desses impactos sobre a sociabilidade nas áreas de baixa renda; e sobre a questão das redes de transportes vistas sob o ângulo de sua implicação sobre a mobilidade populacional espacial e o processo de urbanização com estudos sobre as redes viárias e o automóvel e sobre as ciclovias; assim como estudos sobre as políticas de Estado para a infra-estrutura. O Laboratório das Regiões Metropolitanas, por seu turno, tem trabalhado em estudos sobre aspectos político-institucionais das regiões metropolitanas brasileiras buscando analisar a questão das formas de administração das metrópoles frente ao esvaziamento observado do instrumento do planejamento, visa- vis a expansão e complexidade que as grandes regiões metropolitanas tem apresentado. Ao adentrar no seu sexto ano de publicação Chão Urbano é fruto da nossa persistência frente às reconhecidas dificuldades e movimentos contrários à Universidade Pública brasileira, e internamente à fragilidade de infra-estrutura, recursos humanos e financeiros e entraves acadêmicos. Contudo, o trabalho de pesquisa e ensino que desenvolvemos e sua difusão através do Chão Urbano não se curva, e não se curvará a nenhum impedimento.

 

 

                                              Dinâmica imobiliária atual-informal e formal - no Rio de Janeiro e sua relação com o “rentismo”

 

 

 

 

 

 

Antes do advento do Sistema Financeiro de Habitação (SFH) no final dos anos 60 do século XX, quando tem-se fonte abundante e regular de crédito para financiamento da produção e comercialização de imóveis no Brasil, sob uma forma capitalista mais desenvolvida, predominava a forma “rentista” como maneira de construção e compra de moradia. Esta forma “rentista”, de maneira simplificada, trata-se daquela onde um indivíduo ou grupo de indivíduos juntam recursos excedentes para construir imóveis e alugá-los para auferir renda, ou para vendê-los quando de uma valorização expressiva em relação ao seu custo. Com a presença do SFH, essa modalidade deixou de ser preponderante. Contudo, com a crise do sistema nos anos 80, e o encarecimento exagerado da tomada de empréstimos para o setor, devido aos altíssimos juros cobrados no país, ao buscar-se a moradia o “rentismo” tem reaparecido de várias formas. Se bem que mantendo-se subjacente à forma capitalista mais desenvolvida, em particular nos bairros suburbanos onde num mesmo lote constrói-se uma segunda casa (permitida por lei desde 1948 no governo Dutra) para aluguel, ou na compra de apartamentos, em pequenos prédios para renda de aluguel ou como defesa contra as crises econômicas, somente mais recentemente o “rentismo” ganha nova força. O interessante é que seu reaparecimento parece dar-se nitidamente não no mercado formal de moradias, mas no setor informal. Pois será a partir de meados da década de 80 que sinaliza-se um novo momento de expansão das favelas cariocas. Esta expansão caracteriza-se por sua extensão horizontal levando a criação de conglomerados ao juntarem-se com outras favelas em seu entorno que dão origem aos chamados “complexos” (Complexo do Alemão, por exemplo) assim como ao seu adensamento por meio de uma verticalização, e ao surgimento de novas favelas principalmente na zona Oeste, acompanhando o crescimento da cidade nesta direção. Esta expansão, cuja causa estaria numa pauperização de camadas já pobres e de camadas de renda média baixa e média  (principalmente pela transferência de renda, arrocho salarial e política de juros altos ocasionados de Planos Econômicos) acoplada à crise do SFH conduz grande contingente populacional a procurar moradia informal (até como estratégia de sobrevivência como fuga de impostos da cidade formal). Neste sentido, pode-se observar a construção por moradores antigos de novos andares em suas casas para criação de renda por aluguel, assim como de maneira mais forte a entrada nas favelas de “construtores” e “incorporadores” informais que adquirem desde “direitos” de laje, posse de lotes, compra de barracos e casas e invasões de áreas contíguas, para construírem moradias para aluguel. Pode-se apontar que este mercado imobiliário “rentista” é um dos elementos1 de maior contribuição para a expansão e verticalização corrente das áreas de favelas no Rio de Janeiro. O setor imobiliário formal acompanhou a tendência rentista e tem ampliado-se. Um primeiro sinal da volta do “rentismo” foi constatado quando da liberação legal para o retorno de construção de vilas de casa em terrenos onde antes só permitiam-se uma ou duas casas. Neste caso, as vilas localizam-se predominantemente na Zona Oeste e subúrbios, e embora exista um único proprietário que as construiu, a maior parcela (segundo amostra que o Laboratório Redes Urbanas realizou), são vendidas a terceiros e estes alugam-nas individualmente. Uma outra forma muito comum está sendo a compra de lotes em condomínios fechados que multiplicam-se na Zona Oeste (Jacarepaguá, Vargem Grande e Pequena, Recreio, Campo Grande, Santa Cruz e na Barra, nesta pela camada de alta renda) na construção de casas para aluguel ou venda. Dois outros sinais mais recentes podem ser percebidos. Um deles trata-se da modalidade de compra de imóveis por obra por administração (onde o custo da obra é rateado pelos compradores e a construtora apenas administra a obra). Esta forma de construção de imóveis não apenas reduz o custo da compra, mas por não estar atrelado a financiamentos bancários de juros muito altos, aponta-se que muito indivíduos têm comprado imóveis por esta modalidade como forma de rentabilizar o investimento, seja para renda por aluguel ou revenda com lucro em relação ao custo de compra (“A nova corrida pela casa própria” – O Globo, 26/01/06). O outro sinal está na velocidade de comercialização de unidades em empreendimentos imobiliários que buscam a estratégia de inovação comercial. Esta estratégia aponta agora por um lado, para a ampliação da internalização no empreendimento de “novidades” na parte do lazer (como SPA, ofurô, fitness, espaço de alimentação, sofisticado lounge, etc), e serviços, introduzindo a idéia de trabalho no próprio local de residência (escritórios equipados com informática, por exemplo). Por outro lado, os incorporadores buscam a inovação locacional articulada ao lazer e serviços descritos acima (“Um novo Eldorado imobiliário na cidade” – O Globo, 27/11/05) lançando grandes empreendimentos em áreas “desvalorizadas” no Centro do rio, e nas proximidades do Largo do Machado. Em todos os casos denota-se a velocidade das vendas. O empreendimento no Centro vendeu seu total de 688 unidades em 2 horas e os demais em poucos dias. Numa amostragem por entrevistas com compradores destes empreendimentos ressalta-se um mímero expressivo de compradores que seriam os “investidores”, ou seja, os que adquirem os imóveis para alugá-los ou revendêlos quando de uma valorização para auferir renda. Uma parcela ainda apontou para a compra como meio de proteção frente a alguma crise econômica, confisco de aplicações, etc. Sem a configuração de um novo Sistema de Financiamento da Habitação com prestações viáveis em relação aos salários recebidos e uma política de juros mais baixos, a tendência é a modalidade “rentista” continuar e expandir-se. A implicação desta modalidade, sobre a estrutura urbanística do Rio de Janeiro será assim cada vez mais visível: a extensão, adensamento e verticalização das áreas de baixa renda, principalmente de favelas, a multiplicação das vilas de casas, das casas individuais em condomínios fechados, e o adensamento por uma de edifícios isolados, e por grandes empreendimentos com muitas unidades com internalização de lazer e serviços em áreas degradadas ou “desvalorizadas”.

Mauro Kleiman

 

Arquivo da Revista