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Chão Urbano

Chão Urbano ANO II Nº 01 Abril 2002

01/04/2002

Integra:

ANO II Nº 01 Abril 2002

 

                                                        Laboratório Redes de Infraestruturas e Organização Territorial - IPPUR/UFRJ  

 

Coordenação Mauro Kleiman  

 

Equipe: Alexandro Garcia, Andressa Martinez, Genivaldo Santos, Leriane Romão,Nina Silva, Priscila Olinger

 

 

Editorial

O Redes Urbanas - Laboratório de Redes de Infra-Estrutura e Organização Territorial - sob a coordenação do Prof. Mauro Kleiman, inicia uma nova fase na publicação de “Chão Urbano”. A partir de intenso trabalho de pesquisa (com o apoio do Cnpq),o “Redes Urbanas” busca por iniciativa própria, contando apenas com o interesse e dinamismo de sua equipe, divulgar seus resultados e analisar a conjuntura sobre o tema das políticas de infra-estrutura e organização territorial, através de publicações. Entre estas, “Chão Urbano” micro boletim mensal de análise conjuntural opinativa sobre as cidades, sua infra-estrutura de redes urbanas; habitação e mercado imobiliário; circulação, transportes e processo de urbanização, entre outros- completou seu primeiro ano (doze números). No segundo ano, que iniciamos agora, além da publicação por e-mail e pelo site do Laboratório www.ippur.ufrj.br/chaourbano, também haverá uma edição impressa. Trata-se de uma forma de resgatar uma maior proximidade da publicação com seus leitores. No caminho inverso da virtualidade, a concretude da folha impressa traz de volta a intimidade com a notícia, e torna-se também expressão adicional de nosso trabalho. No número1 do ano II “Chão Urbano” aborda os mais recentes indicadores sobre água e esgoto no Brasil, mostrando modificações e permanências nas condições de habitabilidade, apontando desigualdades regionais; e a polêmica sobre a utilização de viadutos como forma de resolução de problemas viários no Rio de Janeiro.

 

Circulação , Transportes e Processo de Urbanização

 

Obras viárias e cidade: para que os viadutos?

 

A quantidade de veículos automotores - ônibus, vans, kombis, automóveis, não cessa de crescer nas cidades brasileiras. A circulação pelas cidades na locomoção entre as atividades cotidianas faz-se principalmente e majoritariamente sobre rodas. No Rio de Janeiro circulam cerca de 6000 ônibus, 5000 vans e kombis legalizadas e 1.800.000 automóveis . A evidência da majoritária circulação através de transportes automotores nas cidades brasileiras, tem conduzido historicamente a uma priorização dos investimentos na rede viária , principalmente a partir da segunda metade do século XX. No Rio de Janeiro , sucessivos governos construíram imensos túneis, vias expressas, elevados, viadutos, “ trevos de viadutos”.... como forma de dar conta do crescente tráfego, em detrimento dos modos de transportes ferroviários, metroviários, dos bondes e hidroviários. Muito se fala e escreve-se sobre outros meios de transporte que não o automotor e suas qualidades para locomoção de massa , mas o que se nota é que a rede viária continua a ser ampliada e sofisticada tecnicamente. Nos últimos governos municipais, contudo, iniciou-se um discurso que prega que determinadas soluções de tráfego não sejam mais construídas, visando desestimular o uso de automóveis . Assim, escolheu-se como alvo, os viadutos ( “ Prefeitura lança cruzada contra os viadutos” – O GLOBO 26/09/ 2001). Ora, propõe-se demolir o elevado da Perimetral ( “... O Sirkis adora a idéia de derrubar o elevado da perimetral...” O GLOBO 26/09/2001); ora pretende-se derrubar uma alça do elevado Paulo de Frontim em direção ao centro ( “... na hora que destruirmos o viaduto da Cidade Nova a população começará a ver a questão com outros olhos...” Prefeito César Maia, em o GLOBO-28/09/2001), ora o prefeito desiste do viaduto na auto- estrada Lagoa Barra na confluência com o trânsito do Leblon , optando-se por mudanças de tráfego ( “ com as alterações viárias economizamos um viaduto. Construir um “mergulhão” seria muito caro”. Prefeito César Maia em o GLOBO 26/09/2001). Os viadutos não deveriam ser estigmatizados como “monstros”, pois são uma solução técnica quando o volume de tráfego atinge tal grau, que não pode mais ser organizado por sinais de trânsito , já que os congestionamentos estendem-se por vários quilômetros afetando outros cruzamentos e a fluidez do trânsito. O custo social de ficar horas parado ( e também à mercê da insegurança da cidade) certamente se for medida, apontará para valores muito mais elevados do que a obra de um viaduto e os ganhos na velocidade da circulação entre residência e trabalho, escolas, hospitais, etc. Vários cruzamentos no Rio de Janeiro estão exigindo viadutos. Com o discurso “anti-automóveis e viadutos” , como continua a crescer o tráfego automotor, vários pontos de congestionamento agravam-se na cidade. Muitos deles localizam-se nos pontos ou da própria área de maior crescimento da região Oeste da Barra- Recreio- Jacarepaguá ou nos seus acessos e ligações com zonas próximas. Assim não apenas na “Lagoa-Barra” como na própria Barra e em Jacarepaguá, é urgente a construção de circulação em níveis diferentes ( os viadutos) como, por exemplo, na ligação da Avenida Ayrton Senna com a Abelardo Bueno que liga a Barra com o Recreio, Vargem Grande e Pequena e Curicica/ Taquara . Os viadutos na Taquara, fazem-se necessários para dar conta de todo o tráfego dos subúrbios e Zona Oeste, Bangu, Campo Grande, Santa Cruz que se dirige à Barra ( a quantos anos a CET não faz a contagem DO número de veículos que atravessam  a Taquara em direção à Barra? Certamente há muitos anos, pois somente na década de 80 abriu-se este caminho com as pontes na Av. Alvorada). Ao invés de construir-se viadutos, nos últimos governos implantou-se sinais de trânsito a cada dez metros, tornando ainda mais difícil o dia-dia dos cariocas. Mas como não se faz investimentos nos outros meios de transportes ,o próprio prefeito atual parece querer rever discurso anti-viadutos e já pensa na obra de cruzamento da “Lagoa Barra” com o tráfego do Leblon ( “César pedirá ajuda a FH para ampliar Lagoa Barra” – O GLOBO 17/01/2002). Para dispensar os sinais serão construídos dois mergulhões e o outro sob a praça Sibelius... –(O GLOBO 17/01/2002 ) e para o prefeito “a obra vai resolver de vez e só na ligação entre a Zona Sul e Barra”- (O GLOBO17/01/2002). Evidentemente que as cidades brasileiras necessitam do desenvolvimento mais amplo dos modos de transporte de massa e meios não poluentes, notadamente o metroviário e o ferroviário e de um sistema de veículos leves sobre trilhos (bondes). Porém não há como não enfrentar a questão viária, dado que não existe no horizonte desaquecimento na produção e demanda por veículos automotores, principalmente individuais . Pelo contrário, com a instalação de novas fábricas de carros, no Rio de Janeiro , tende a aumentar o número de veículos nas ruas, sendo necessária a utilização de todas as técnicas , inclusive a do cruzamento em níveis diferenciados- os viadutos para um equacionamento da circulação de pessoas, bens e serviços, sem o agravamento do custo social dos bloqueios e entraves na rede viária.

 

 

Infra-estrutura e Habitação

 

Condições de habitabilidade no Brasil: mudanças e permanências

 

Os indicadores nacionais, observados nos resultados que estão sendo divulgados sobre o Censo 2000 do IBGE, acerca do abastecimento de água e de domicílios com rede de esgoto e ou/ fossa séptica, mostram avanços nestes dois elementos  fundamentais para o cotidiano. Os percentuais merecem, entretanto, uma análise mais acurada para sua real compreensão. Inicialmente, pode-se “comemorar” avanços nos números quando os domicílios com abastecimento de água passam de 70,7% em 91 para 77, 8% em 2000, e aqueles domicílios com adequação sanitária, ou seja, ligados à rede de esgoto e /ou fossa séptica passam de 52,4% em 91 para 62,2% em 2000. Nota-se pois que o crescimento do abastecimento de água, que historicamente sempre superava o de adequação sanitária, apresentou desaceleração relativa com mais 7,1% entre os dois censos, e houve um maior crescimento do esgotamento com 9,8% a mais entre 91 e 2000. Permanece, contudo, a defasagem entre abastecimento de água e seu esgotamento adequado. Por outro ângulo, mesmo com o reconhecimento de avanços, pode-se verificar que 22,2% dos domicílios no Brasil, ainda não possuem abastecimento de água e 37,8 % não tem adequação sanitária, apresentando números extremamente elevados, ainda mais quando se pensa que ter água e cuidar para o esgotamento das águas servidas, trata-se do mínimo de uma vida digna. Enquanto na região Sudeste 82,3% dos domicílios contam com rede de esgoto ou fossa séptica, no Nordeste o percentual atinge ainda apenas 37,8% dos domicílios e no Norte 35,6%. Apesar dos percentuais ainda serem baixos nestas duas últimas regiões, pouco mais de um terço dos domicílios está atendido. Nota- e expansão importante no Nordeste quando em 91 menos de ¼ das casas tinham atendimento ( 24%), e no Norte que passa de 25,8% em 91 para 35, 5% em 2000. No Sul, o percentual de domicílios estabilizou-se, pois se em 90 tínhamos 53,45% atendidos, em 2000 o percentual é de 53,8%, enquanto que na região Centro- Oeste houve expansão de 34,8% em 91 para 40,85 em 2000. Em relação ao abastecimento de água as diferenças também permanecem, pois no Sudeste a cobertura já chega muito próximo à uma universalização do atendimento, atingido em São Paulo 93,%, 83% no RJ e MG, e 80,8% no ES; enquanto que na região Norte alguns estados apresentam índices ainda muito baixos - Acre com 36,1% ,Rondônia 30,7% Pará 42,6%, Amapá 50,8%, Maranhão 53%, melhorando um pouco no Amazonas 60% , Piauí 60,85% e Roraima 79,2%. No Nordeste o quadro apresenta sinais de estabilização do atendimento numa faixa em torno de 65% a 70%, sendo Rio Grande do Norte, Sergipe e Pernambuco os estados melhores servidos ( 78,2%, 75, 6% e 70,5% respectivamente), enquanto que o Ceará atende apenas 60,8% dos domicílios e Alagoas 63,4%, ficando a Bahia com 69,5%. Como o grau de urbanização atingiu patamares bastante elevados, avançando no Nordeste e Norte mais que nas demais regiões ( de 60,65% em 91 para 69,07% em 2000, no primeiro, e de 59,05% em 91 para 69,85% em 2000 no segundo), percebe-se que mesmo tendo havido uma ampliação na cobertura dos domicílios esta não acompanha o crescimento das cidades. Mesmo nas regiões mais desenvolvidas, Sudeste e Sul, a defasagem é latente : o esgoto cobre 82,3% dos domicílios mas a urbanização atinge 90,52% no Sudeste, e atende-se 53,8% dos domicílios no Sul , enquanto a urbanização atinge 80,94%. No Centro- Oeste a crescente urbanização que já supera agora o sul atingindo 86,73%, apenas 40,8% dos domicílios estão atendidos por esgotamento. Tirante, por fim, o fato de que os indicadores dos Censos revelam de maneira restrita a situação das condições de habitabilidade, pois captam a existência física da ligação com as redes, mas não se os serviços efetivamente são prestados ( não basta ter o cano, mas que a água nele circule 24h / 24h com volume, pressão e qualidade biológica ), podemos concluir que houve avanços nas possibilidades de melhoria da qualidade das condições de habitabilidade em água e esgoto no Brasil, permanecendo, contudo, as desigualdades regionais.

 

Mauro Kleiman

 

 

 

 

 

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